Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

Delito de Opinião

Leituras

Pedro Correia, 24.12.15

seculopassado_0658828001293449580[1].png

 

«Teria eu lido o Gatsby, se Fitzgerald não lhe tivesse aposto o Great? A Enseada, se não me perguntasse por que é que Abelaira lhe chama Amena? O Anjo, não fosse ele Ancorado? As Palavras, não as anunciasse Maria Judite como Poupadas? O Dia, não o pintasse Mário Dionísio de Cinzento? Como veria eu o mundo da colonização se Shakespeare não o entrevisse "admirável" (brave) e "novo" (new)? Teria eu sido tingido pela soturnidade e pela melancolia de Lisboa/Cesário se o desejo de sofrer não fosse subitamente absurdo? Teria ultrapassado o primeiro parágrafo de Moby Dick sem o damp, drizzly November in my soul ("desperta na minha alma um Novembro brumoso e húmido" na tradução de Alfredo Margarido)? Andaria eu de Gomes Leal no bolso sem o Bela, dizia eu, fria como o luar / sobre o dorso luzente e excepcional dum peixe?

(...) O adjectivo cria uma precária onda por sobre as coisas, insegura curva sensorial, provisório tempo. E não é isso o que o actor num palco faz com o corpo e a voz e o olhar, irrepetível, irremediável cor, irremediável gesto?»

Jorge Silva MeloSéculo Passado, pp. 228/229

Ed. Cotovia, 2007