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Delito de Opinião

Legislativas (8)

Pedro Correia, 14.09.15

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DEBATE ANTÓNIO COSTA-CATARINA MARTINS

 

O secretário-geral do PS saiu esta noite claramente vencedor do debate que travou na TVI 24 com a porta-voz do Bloco de Esquerda. Um debate que começou em atmosfera cordata mas que cedo se foi crispando.

Catarina Martins até foi a primeira a marcar pontos, conseguindo irritar António Costa ao mencionar um ponto "escondido" do programa socialista: o congelamento das pensões de reforma na próxima legislatura.

"Os pensionistas continuam a ser uma espécie de porquinho-mealheiro dos saldos orçamentais", atacou a líder bloquista, acusando o PS de procurar consolidar as contas públicas, na próxima legislatura, em 1,660 milhões de euros à custa dos pensionistas, que veriam o seu rendimento inalterado até 2019. "Tem a mesma lógica da direita: uma contínua desvalorização salarial."

 

Agarrou-se de tal forma a este tema que acabou por invocá-lo oito vezes, com manifesto exagero. Costa começou à defesa: "Não assumimos compromissos além daquilo que responsavelmente podemos gastar. Prefiro assumir um compromisso menor [na segurança social] e ir mais além em vez de prometer algo que não posso cumprir."

Mas cedo passou ao contra-ataque, colando a sua parceira de debate às políticas fracassadas do Syriza e apontando um dedo acusador: "O Bloco pode prometer tudo a todos - dos pensionistas às crianças que estão no berçário, porque todo o seu programa assenta na reestruturação da dívida. Depois do que aconteceu na Grécia, o BE devia ter alguma humildade. Alguém acredita que se houvesse um governo BE conseguiria aquilo que Tsipras e Varoufakis não conseguiram?"

 

Catarina descolou do Syriza, reconhecendo que "as esperanças dos gregos foram esmagadas e foi-lhes imposto um programa de austeridade e pilhagem". Mas insistiu na reestruturação da dívida, invocando a antecessora de Passos Coelho na liderança do PSD em abono da sua tese enquanto endereçava uma farpa a Costa: "Está à direita de Manuela Ferreira Leite, que acha necessária a reestruturação da dívida." Foi pelo menos a quinta vez que a líder do BE evocou a antiga presidente do PSD nesta campanha...

Costa devolveu-lhe a farpa com juros, aproveitando para fazer uma confissão: "Sempre fui social-democrata, desde os 14 anos, sem tentações esquerdistas. E sempre me afligiu nos esquerdistas passarem a vida toda a fazer discursos, incapazes de resolver um problema concreto de uma pessoa."

Catarina acusou-o de "desistir do País". Mas o secretário-geral socialista ia embalado e não afrouxou: recorrendo por sua vez ao programa bloquista, disse que o BE quer nacionalizar a banca, a GALP, a REN e a EDP. "Onde estão as contas? Onde vão buscar o dinheiro? Quanto custa isto?"

 

Ficou claro que existem demasiados temas a separar socialistas e bloquistas: a manutenção do País na moeda única, a consolidação das contas públicas, os compromissos europeus, o vasto pacote de estatização de empresas que consta das prioridades do BE. Mas Catarina aproveitou o minuto final para ensaiar a que seria a surpresa da noite, numa óbvia tentativa de combater a dinâmica do voto útil à esquerda: está disponível para dialogar com o PS, no dia seguinte às legislativas, se os socialistas puserem de lado o congelamento das pensões, o anunciado corte da TSU e o "regime conciliatório que flexibiliza os despedimentos". A menos que - ironizou - o actual líder do principal partido da oposição prefira dialogar "com Rui Rio ou Paulo Portas".

Deste repto poderia ter resultado a principal notícia deste frente-a-frente, moderado pelo jornalista Pedro Pinto. Mas assim não foi. Porque Costa o ignorou por completo. Falou depois de Catarina sem demonstrar sequer ter ouvido alguma coisa.

Saiu com uma imagem mais moderada deste debate do que entrou. E nada mais lhe interessava senão isto.

 

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FRASES

Catarina - «Sempre distingui o PS da direita.»

Costa - «Tem dias, tem dias...»

Catarina - «Os partidos socialistas europeus contribuíram para o esmagamento da Grécia, para a chantagem.»

Costa - «Tenho alguma irritação com o Bloco de Esquerda...»

Catarina - «Temos de nos preparar para um eventual rompimento com a União Monetária.»

Costa - «Pior que tudo seria a desvalorização atroz que resultaria da nossa saída do euro. Imagina o que seria o salário mínimo nacional convertido em escudos?»

Catarina - «Assumir o confronto é a única forma de defender o País.»

Costa - «Assumir o confronto foi aquilo que o governo Syriza quis fazer, com os resultados que teve.»

2 comentários

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    Pedro Correia 15.09.2015

    Caro JPT, esta é apenas a minha visão do debate, nada mais. Aqui, ao contrário do futebol, que ambos apreciamos, a margem de subjectividade é enorme.
    Achei preguiçosa a prestação de Catarina Martins. Agarrou-se à questão do congelamento das pensões - de facto, um bom argumento para um debate - e não mais a largou. Como se não precisasse de mais nada. E o pedido de boleia a Manuela Ferreira Leite começa a ser também uma carta demasiado previsível: já a ouvi cinco vezes invocar a antiga presidente do PSD em socorro das suas teses.
    Costa - ao contrário de Portas, que perdeu com ela, e de Passos, que empatou - questionou directamente as bases financeiras do programa eleitoral do Bloco, que se baseia numa hipotética "reestruturação da dívida". Tentada pelo Syriza na Grécia, sem o menor sucesso - como ficou igualmente sublinhado com clareza pelo líder do PS.
    Como pode toda aquele aumento de despesa pública basear-se nesse nítido nulo que é a pretensa "reestruturação da dívida"?
    E como pode o amplo programa de "nacionalizações" do Bloco ser pago com dinheiro que não há? Aqui também Costa marcou pontos.
    Faz falta esta clareza ao nosso debate político.

    Fica a lição para futuros debates: os protagonistas da política só têm a ganhar com linguagem simples, clara, frontal e sem jargão (do género "plafonamento", que leva qualquer telespectador a mudar de canal).
    No final, percebendo que perdera o debate, Catarina Martins sacou da manga o inédito piscar de olho ao PS para uma hipotética coligação pós-governamental. Com isso pretendeu apenas, além de controlar danos, demonstrar que o voto útil à esquerda também pode recair no BE.
    Costa fez bem em não responder. Porque dito daquela forma, no minuto final do debate, aquilo não poderia ser sério. O PS precisa de se reposicionar no eixo central da política portuguesa. Tem de puxar o BE para o seu lado em vez de se deixar empurrar pelo BE para a lateral esquerda (e cá estou eu já a confundir política com futebol...)
    É salutar divergirmos, meu caro.
    Um abraço.
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