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Delito de Opinião

História Triste da Queda de Constantino XI (uma recapitulação)

Bandeira, 28.12.16

Havia em Constantinopla, hoje Istambul, uma grande estátua equestre que representava o imperador Justiniano segurando um orbe com uma das mãos e levantando a outra na direcção do Leste. Os bizantinos acreditavam que a mão tinha o poder mágico de fazer parar exércitos e que o Império não cairia enquanto a bolinha se mantivesse no seu lugar.


A verdade é que ela tombava com frequência, tanta que as pessoas evitavam passar-lhe por baixo, mas depressa voltavam a colocá-la no sítio e calceteiros disfarçavam a depressão no pavimento com bonitos mosaicos de padrões em trompe l'oeil.

 

No ano da desgraça de 1453, o otomano Maomé II fendeu as muralhas de Constantinopla, quero dizer: não ele, claro, mas os projécteis de um canhão mastodôntico inventado por um húngaro a quem os bizantinos não haviam podido pagar e que, em vista disso, se passara para o lado muçulmano. Constantino XI morreu defendendo as pedras da brecha por onde a cidade foi tomada, mas havia já quem dissesse que ele voltaria pela mão do anjo que o tirara da batalha e o levara para uma gruta sob a cidade, onde o adormecera e enfaixara da cabeça aos pés porque achava que essa era a coisa certa a fazer e estava com tempo.

 

Tal especulação não era agradável aos ouvidos do conquistador, o cujo de imediato exigiu a presença da imperial cabeça senão. Os seus homens encontraram o corpo de Constantino, que reconheceram pelas meias púrpura com pequenas águias bordadas, mas a cabeça havia sido cortada, como aliás as de praticamente todos os defensores; cada época seus costumes. Não houve remédio senão retirar do monte de cabeças ensanguentadas aquela que aos turcos pareceu melhor se adaptar à figura do imperador.

 

Mantido na ignorância de tais dificuldades, Maomé II ordenou que a cabeça fosse dependurada da mão com que a estátua de Justiniano mandava parar o Oriente. Isso mostraria aos bizantinos que as histórias sobre o regresso do seu imperador “não tinham pés, apenas cabeça”, e todos ririam muito e achariam que ele era engraçado.

 

Mas os habitantes de Constantinopla, olhando a estátua, diziam uns para os outros baixinho:

 

“Hahahaha, eu conheço o Constantino e aquela não é a cabeça dele.”

 

Isso reforçou a crença na lenda do imperador adormecido; e começaram a circular pela cidade desenhos perturbadores representando um homem enfaixado guardado por um anjo.

 

Muitos anos durou a crença. Até que, no século XIX, um navio inglês vindo do Egipto aportou à cidade carregando antiguidades várias, entre as quais uma múmia a que as autoridades turcas deram de imediato ordem de prisão, pois julgaram ver nela a figura do imperador; e acusaram os ingleses de pretenderem restaurar Constantino XI no trono do Império Romano do Oriente.

 

Então cortaram a múmia em pedaços, e hoje poucos são os que acreditam que o imperador vai regressar, pelo menos em boas condições.

 

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Nota bene: este texto é de 2008 - mas não quis deixar de recapitular nestes dias em que todos, uns mais, outros menos, recapitulam.

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