Frente fria de esquerda
Afinal, António Costa não apenas está muito longe de constituir o Salvador da Pátria anunciado com trombetas e panegíricos pelos seus apoiantes como se revela muito pior do que os seus adversários afirmavam. Entende-se o motivo por que se agarra à liderança do PS - para onde iria, abandonada a Câmara de Lisboa e a hipótese de uma candidatura às presidenciais? - mas não é bonito ver alguém tão desesperado por manter a relevância após uma derrota clara, ainda por cima tendo forçado a saída do líder anterior com o argumento de que este ganhava «por poucochinho». Evidentemente, os estados de alma de Costa seriam um detalhe irrelevante, um momento de reality show merecedor da mescla de pena e desprezo com que se encaram os mini-dramas do Big Brother ou da Casa dos Segredos, não fosse apesar de tudo o PS essencial ao sistema político português - em qualquer instante e em particular num cenário como o resultante das eleições do passado domingo (a que acresce a fragilidade da situação económica). Mas Costa parece considerar mesmo a hipótese de vir a liderar um governo formado por Partido Socialista, Bloco de Esquerda e Partido Comunista. Tratar-se-ia, como qualquer pessoa com dois dedos de testa percebe, de um governo colado a cuspo: que entendimento seria de esperar entre os três partidos nos assuntos europeus, na resposta aos compromissos assumidos junto da NATO ou mesmo perante as reivindicações da CGTP? Na verdade, a «solução» apresenta tais possibilidades burlescas que quase me fazem desejá-la. Mas convém manter algum bom senso. Seria um desastre para o país. E também para o PS. Se, em 2011, PSD e CDS obtiveram 50% dos votos, nas próximas eleições atingiriam 55% ou 60%. E o PS desceria para cerca de 20%. Haja alguém por lá que meta juízo na cabeça do homem.
Nota sobre o título: a frente é fria porque me provoca um arrepiozinho - entre o horror e o prazer mórbido.