Fora da caixa (22)
«Poucos deram tanto a Portugal, à liberdade e à democracia.»
António Costa, ontem, sobre Freitas do Amaral
A campanha eleitoral terminou ao princípio da tarde de ontem. Precisamente quando foi conhecida a triste notícia do falecimento de Freitas do Amaral, o último fundador civil do nosso regime democrático - resta o general Ramalho Eanes, ilustre sobrevivente desta estirpe já com lugar na História.
Este infeliz acontecimento relegou para segundo plano tudo quanto vinha a ser discutido no espaço mediático, o que muito jeito dá a António Costa - confirmando que o secretário-geral socialista é o político com mais sorte em Portugal. A campanha corria-lhe razoavelmente mal: Costa está longe de ser brilhante nas caravanas de propaganda eleitoral, para as quais tem pouco jeito e quase nenhuma paciência. A nova dimensão dada ao lamentável caso de Tancos, centrada na acusação deduzida pelo Ministério Público ao ex-titular da pasta da Defesa Azeredo Lopes, fragilizou o primeiro-ministro numa das dimensões que mais cultiva: a sua faceta de homem de Estado.
O desaparecimento de Freitas, senador da democracia, e as cerimónias fúnebres que lhe serão devidas hoje e amanhã, dia de reflexão eleitoral, encerram simbolicamente um capítulo da nossa vida colectiva. E põem fim prematuro a uma campanha que se revelou mais incómoda para o PS do que alguns responsáveis socialistas previam.
Recordo-me da dramática recta final das legislativas de 1999, marcada pelo súbito falecimento de Amália Rodrigues, que gerou comoção nacional. Foi a 6 de Outubro, vai fazer 20 anos depois de amanhã - quatro dias antes de os portugueses irem então a votos.
Também a campanha terminou nesse dia. E dela saiu uma vitória pírrica do PS: António Guterres ficou a um escasso lugar da maioria absoluta e acabou por nunca recuperar desse trauma. Nascia uma legislatura condenada ao fracasso desde o vagido inicial.
Embora com protagonistas diversos, a História tem tendência a repetir-se.