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Delito de Opinião

Fora da caixa (11)

Pedro Correia, 19.09.19

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«O crime da violação do segredo de justiça dá-se por diversas vias

Rui Rio, ontem, no debate radiofónico

 

Inútil pensar que ele muda: este homem não tem emenda. Embalado com a sua prestação relativamente positiva no debate televisivo com António Costa, para o qual partiu com expectativas muito baixas e em que o líder socialista tudo fez para nunca o hostilizar, Rui Rio voltou a mostrar-se impreparado e errático no debate radiofónico que ontem reuniu os seis principais dirigentes partidários. Com palco simultâneo na Antena 1, Renascença e TSF.

A despesa da crítica ao Governo - repetindo, aliás, o que sucedeu na metade final desta legislatura - esteve a cargo de Assunção Cristas: só ela é capaz de arrancar Costa àquela espécie de letargia que o envolve nas recentes aparições públicas. Rio, sem mostrar a menor sintonia com a líder do CDS, não ousou beliscar a "geringonça", preferindo fixar a pontaria em dois dos seus alvos de estimação: juízes e jornalistas. No dia em que um secretário de Estado era forçado a abandonar o Governo - onde já se contabilizam 25 demissões - por suspeitas de corrupção, participação económica em negócio e fraude na obtenção de subsídio - o presidente do PSD aproveitou para fazer a apologia do combate à promiscuidade entre negócios e política? Nem pensar: disparou antes contra as «fugas de informação» alegadamente promovidas pelo Ministério Público e sobretudo contra os meios de comunicação social graças aos quais os portugueses se apercebem de que há políticos suspeitos de práticas delituosas.

Nunca vemos Rio tão arrebatado como nestas ocasiões em que declara guerra aos órgãos informativos: «O crime da violação do segredo de justiça tem que ser aplicado a todos os portugueses!», bradou o sucessor de Passos Coelho no comando do partido laranja. Precisamente quando a imprensa noticiava a realização de «buscas em oito habitações e 46 locais, incluindo o Ministério da Administração Interna e a sede da Protecção Civil no âmbito do caso da compra das golas anti-fumo». Com Rio a mandar, tais notícias seriam substituídas por um ordeiro, respeitoso e monacal silêncio. Jornalista que cumprisse o seu dever, publicando notícias, iria parar à cadeia.

Felizmente alguém lhe deu o merecido troco neste debate. Foi Catarina Martins, dizendo estas palavras simples e claras: «Limitar a liberdade de imprensa e perseguir jornalistas para resolver um problema do Ministério Público, é atacar a democracia. Não podemos permitir isso porque não há democracia sem imprensa livre. Os jornalistas têm o direito de fazer o seu trabalho, têm o direito de proteger as suas fontes, e nós dependemos também do trabalho da imprensa para combater a corrupção.»

Assim vai a política portuguesa: o BE dá lições de moderação e bom senso ao PSD.

 

ADENDA: Presidente da Protecção Civil, no cargo desde 2017, também é arguido. Rio não comenta, certamente exasperado com tanta «violação do segredo de justiça».

17 comentários

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    Pedro Correia 19.09.2019

    Ui. Temos aqui um eleitor do doutor Rio.
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    Makiavel 19.09.2019

    Nada mais errado. Mesmo que o fosse, a questão do justiceirismo na praça pública mantém-se.
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    Pedro Correia 19.09.2019

    Não sei o que isso é.
    Lei da rolha, sei.
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    Makiavel 19.09.2019

    Eu também sei o que é lei da rolha mas também sei a diferença entre isso e o crime de violação de segredo de justiça.
    Não deve saber a diferença, caso contrário não falaria em lei da rolha.
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    Pedro Correia 19.09.2019

    Sou jornalista há 38 anos, sei muito bem ouvir o som dos tambores ao longe, quando os políticos querem condicionar a liberdade de imprensa utilizando um pretexto qualquer. Seja o interesse nacional, seja o prestígio do país, seja a defesa do bom nome de visados, etc, etc, etc.
    Sem surpresa, estes políticos contam sempre com o aplauso de basbaques, prontos a defender "mão dura contra a libertinagem da imprensa".
    Rio faz-se preceder de tais tambores. Não é música para os meus ouvidos.
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    Makiavel 19.09.2019

    Percebo o que quer dizer.
    Mas não me parece que uma ameaça à liberdade de imprensa esteja na ordem do dia. A concentração dos meios de comunicação em poucas mãos parece-me bem mais preocupante. E o estilo rancolho cm a fazer escola também.
    Prepare-se para um novo paradigma com a compra da tvi pela cofina. Mas nisto ninguém fala.
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    Pedro Correia 19.09.2019

    As ameaças são permanentes - e de diversa ordem.
    É um absurdo qualificar os meios de comunicação como "quarto poder".
    Cada vez mais.

    Tal como é ridículo qualificar de "quinto poder" as redes sociais, como vários teóricos já sustêm.

    O poder está sempre relacionado com a organização política do Estado. E não deve ser confundido com instituições de outro género.
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    Makiavel 20.09.2019

    As principais ameaças vêm dos próprios órgãos de comunicação social: mau jornalismo, sensacionalismo, tabloidização, ajudam a formatar as mentes e a condicionar o raciocínio.
    O jornal de maior tiragem é especialista nisso. Mas sobre a poluição do Tejo, provocada pelas empresas do grupo a que pertence, nem um alerta deu.
    A última desilusão nessa área chama-se Polígrafo. Um conceito interessante mas já totalmente enviesado e a fazer fretes às franjas mais populistas da sociedade portuguesa.
    É extraordinário como existindo o crime de violação de segredo de justiça, ainda nenhum caso tenha sido julgado, de entre as centenas que vão aparecendo.
    A divulgação em directo do interrogatório a Miguel Macedo ou a José Sócrates, é pra si um exercício de liberdade de imprensa?
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    Pedro Correia 20.09.2019

    O melhor conceito de liberdade de imprensa é a clássica definição de Orwell:
    «Jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique. Tudo o resto é publicidade.»
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    Makiavel 23.09.2019

    Definições do século XX para realidades do século XXI são sempre incompletas.
    Publicar aquilo que alguém não quer é sempre publicar aquilo que alguém quer.
    Convém saber as motivações para a publicação... e qual a perspectiva.
    Os tempos do preto e branco já lá vão (se alguma vez existiram)
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    Pedro Correia 23.09.2019

    Perdeu uma excelente oportunidade de trazer uma definição melhor do que a do Orwell.
    Portanto, fico-me com ela.
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    Makiavel 23.09.2019

    Não sou de me apegar a definições. São sempre redutoras e deixam sempre para trás pormenores muito importantes. E já sabemos como são os pormenores (ou detalhes) e o diabo.
    E se a definição é do século passado então o cuidado deverá ser maior.
    Não sei porquê mas a sua citação da definição de Orwell sobre jornalismo fez-me lembrar um qualquer comunista a citar O Capital de Marx.
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    Pedro Correia 23.09.2019

    Se a sua lógica tivesse validade, os clássicos gregos, por exemplo, estavam há milhares de anos remetidos ao lixo.
    E, no entanto, a sabedoria deles é intemporal.
    Como bem demonstra este pensamento de Aristófanes:
    «A juventude envelhece, a imaturidade é superada, a ignorância pode ser educada, a embriaguez passa, mas a estupidez dura para sempre.»
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    Makiavel 23.09.2019

    Já percebi que é um perito a citar. Erudição não lhe falta.
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    Pedro Correia 23.09.2019

    É a lei das compensações. Você é um especialista em não-citar.
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    Makiavel 23.09.2019

    Gosto mais de pensar. Paracantarolando uma canção dos Offspring, ‘Citações is só passé”
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