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Delito de Opinião

Focos de incêndio e holofotes

Diogo Noivo, 15.08.16

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Constança Urbano de Sousa, a Ministra da Administração Interna de turno, foi criticada por acudir a uma festa do social, organizada por uma revista cor-de-rosa, enquanto os bombeiros acudiam aos incêndios, uma chaga nacional que insiste em não desaparecer. Ao contrário do que a demagogia de serviço vocifera, os titulares de cargos públicos têm direito a descanso. O problema é que, ao garantir presença na referida festa, mais do que usufruir de um merecido descanso, a Ministra mostrou não compreender a relevância institucional do cargo que ocupa. Momentos infelizes, criados por situações imprevistas, fazem parte da vida. No entanto, lamentavelmente, creio que a ocorrência de fogos no Verão é tudo menos surpreendente.

Os bombeiros e a Autoridade Nacional de Protecção Civil, competências do ministério tutelado por Constança Urbano de Sousa, enfrentam um desafio grave, especialmente perigoso para os homens e mulheres que arriscam a vida para debelar o fogo. Em momentos como este, ainda que no gozo de justo e legítimo descanso, pede-se ao ministro da tutela uma disponibilidade permanente (e aparente) e autoridade institucional. Mesmo que a sua vida pessoal lhe ofereça razões para alegria, pede-se ao MAI que tenha o discernimento de não a manifestar em público quando os profissionais que tutela se oferecem diariamente para realizar o mais elevado sacrifício em prol da segurança de pessoas e bens. Em momentos potencialmente sensíveis, pede-se ao MAI decoro e respeito institucional. São mínimos olímpicos. Constança Urbano de Sousa não se qualificou.

 

As limitações da Ministra explicam porventura a decisão original tomada por António Costa, logo no início da legislatura. Pouco depois de tomar posse, o Primeiro-Ministro decidiu nomear para o seu Gabinete dois oficiais de ligação das Forças de Segurança, um da PSP e outro da GNR. Estas nomeações, que são inéditas, constituem uma declaração política importante. António Costa comunicou assim ao país, e em particular à estrutura de segurança nacional, que a segurança e a ordem pública são assuntos caros ao Primeiro-Ministro – ideia que se torna ainda mais relevante se tivermos presente que, em encarnações governamentais passadas, Costa foi titular das pastas da Administração Interna e da Justiça.

Porém, e sem prejuízo da originalidade e dos méritos destas nomeações, a colocação de um oficial de ligação da PSP e de outro da GNR no Gabinete do Primeiro-Ministro tem como consequência óbvia o enfraquecimento da Ministra da Administração Interna. Os oficiais de ligação, por definição, são um canal directo para a Direcção Nacional da PSP e para o Comando Geral da GNR. Ora, se o Primeiro-Ministro, através do seu Gabinete, passa a ter um contacto directo e permanente com as estruturas que comandam as Forças de Segurança, o papel da Ministra da Administração Interna enquanto interlocutora para o sector fica bastante diminuído. Tendo presentes as declarações da Ministra da Administração Interna, tão populistas quanto inconsequentes, bem como a sua agenda social em época de incêndios, cada vez mais me convenço que o Primeiro-Ministro andou bem quando menorizou o papel político de Constança Urbano de Sousa. Se a outras titulares do MAI tivesse acontecido o mesmo, não teria sido nada mau.

 

Adenda: Já depois de ter terminado este texto, saiu uma notícia, no Diário de Notícias, cujo único propósito é o de informar que, de facto, é a Ministra quem coordena o dossier dos fogos, enquanto o Primeiro-Ministro se limita a acompanhar o assunto. Quando é necessário vir a terreiro dizer o que devia ser óbvio…

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