Filosofar é combater o paternalismo
Ruwen Ogien morreu há dois dias (a 4 de Maio). Recebo a notícia hoje, 6 de Maio, quando se completam 19 anos sobre a morte do meu pai, coincidência que obviamente não coincide com coisa nenhuma a não ser com os meus labirintos interiores. Quem era Ogien? Interessantíssimo filósofo francês, defensor de uma ética minimal que nos defenda do paternalismo e garanta a liberdade de cada um ser o que quiser e como quiser. Este pensador parte do princípio de que não temos qualquer "dever" ou "imperativo" moral para connosco, mas apenas para com os outros; esses deveres podem ser positivos (ajudar, fazer o bem) ou negativos ( não fazer mal), sendo que devemos privilegiar o dever negativo, isto é, o de não interferir na vida alheia, de forma a evitar o paternalismo - nomeadamente, o perigo de fornecermos "ajudas" indesejadas pelo alvo da nossa ajuda, desrespeitando desse modo a sua individualidade e auto-determinação. Particularmente estimulante era o seu método de pensar; Ogien servia-se de toda a espécie de materiais leves e pesados: intuições, experiências pessoais, dados históricos, sociológicos, jurídicos, normas lógicas, etc: entendia que do ecletismo bem organizado nasce a luz.
O último livro de Ruwen Ogien é uma reflexão cáustica e acutilante sobre o culto do "dolorismo" e da suposta redenção através do sofrimento. É também uma crítica cortante ao totalitarismo hospitalar, ao elitismo dos médicos e ao modo como os doentes têm de se transformar em Sherazades do pessoal clínico, encantando-o para merecer os seus favores, designadamente analgésicos. O livro intitula-se: Mes Mille et Une Nuits. La maladie comme drame et comme comédie ( Albin Michel, 2017). Outros livros dele que destaco: L'éthique aujourd'hui. Maximalistes et minimalistes. (Gallimard, 2007) e L’influence de l’odeur des croissants chauds sur la bonté humaine et autres questions de philosophie morale expérimentale (Grasset,2011). Alô, alô, há algum editor por aí com coragem para os publicar?