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Delito de Opinião

Falar menos e proceder melhor

Pedro Correia, 02.06.20

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O Presidente da República, na linha do que fizera dias antes a directora-geral da Saúde, lembrou-se este domingo, à entrada para a missa na Sé de Lisboa, de dar um ralhete aos jovens.

«Não faz sentido que os jovens estejam a organizar festas com centenas de pessoas e muito próximas, e sem a preocupação de distanciamento. As normas sanitárias devem valer para todos», declarou Marcelo, num esporádico regresso à sua anterior condição de professor. 

 

Creio que este ralhete presidencial chega um pouco tarde.

Devia ter-se ouvido um mês antes, e com outros destinatários, que funcionaram como péssimo exemplo para os jovens. Refiro-me aos dirigentes da CGTP, que - num claro incumprimento das normas sanitárias e do próprio estado de emergência então em vigor, que interditava a circulação interconcelhia - juntaram cerca de mil pessoas na Alameda D. Afonso Henriques, em Lisboa, num verdadeiro comício. Mobilizando para o efeito sindicalistas de concelhos limítrofes - incluindo Loures, Amadora e Seixal, que se encontram entre as áreas agora mais fustigadas pela progressão do Covid-19.

As fotografias na altura publicadas, também aqui, não deixaram lugar a dúvidas: foi um acto de inadmissível irresponsabilidade da central sindical. À qual o Presidente e a directora-geral da Saúde assistiram num respeitoso e resignado silêncio.

Esse mesmo mês de Maio chegou ao fim com números preocupantes: centenas de novas infecções diárias; a maioria dos novos casos ocorre na densa periferia de Lisboa, entre pessoas cujas idades oscilam entre os 20 e os 29 anos; e registamos pela primeira vez mais óbitos do que Espanha.

 

Agora, enquanto sustenta (e bem) que não faz sentido algum os jovens andarem por aí a organizar festas em tempo de pandemia, o Chefe do Estado mantém uma posição dúbia e timorata sobre a Festa do Avante!, que continua marcada para um dos epicentros do contágio - o concelho do Seixal.

Concedendo assim ao PCP o mesmo estatuto de inaceitável privilégio que já havia concedido à CGTP no decreto presidencial. Isto quando o PSD e o Bloco de Esquerda, responsavelmente, já cancelaram eventos similares. Isto quando o próprio partido do Governo tomou a iniciativa de adiar o congresso nacional e o processo de eleição do secretário-geral.

 

Marcelo, que muito antes de ser Presidente já era um académico de mérito reconhecido, é o primeiro a saber que a melhor pedagogia não se faz pela palavra, mas pelo exemplo. 

Menos falatório e melhores exemplos: só assim os jovens levarão a sério as gerações dos seus pais e seus avós.

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