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Delito de Opinião

Faço 40, e agora?

Joana Nave, 26.05.21

Cada ano que passa surge como uma nova oportunidade, de fazer mais, melhor, ou apenas tentar manter o nível. Não me recordo exactamente dos primeiros anos de vida e da forma como me senti quando celebrei os meus primeiros aniversários. As fotografias imortalizaram os sorrisos, os bolos, as roupas, mas não captaram a essência.

Quando olho para os meus filhos vejo neles toda a energia e vontade de crescer, de passar para o nível seguinte. É tão importante ser crescido, ter direito à sua própria voz, tomar decisões sem limites, fazer escolhas arrojadas sem o sermão da advertência, castrador. Lembro-me de querer o mesmo que eles, avançar, seguir em frente, ter o meu destino nas minhas mãos, arriscar sem receio, lutar pelos meus sonhos e ideais. De querer tanto abraçar o futuro, fui-me esquecendo de viver o presente, que se ia escapando por entre os dedos, a correria desenfreada de querer sempre mais, de acumular experiências e também coisas. Passei três décadas neste estilo de querer e, só na viragem da última década, me apercebi que muitas coisas eram um verdadeiro contrassenso, porque à medida que ia tomando consciência dos problemas ambientais, da saúde mental, das relações, fui continuando a encher o baú das recordações, para me manter segura com o peso da minha bagagem.

Foi preciso ser mãe, de um e mais um, para perceber que a vida nos desafia constantemente a sair da nossa zona de conforto para abraçarmos a verdadeira felicidade, que só se encontra na liberdade. Esta liberdade é a que nos liberta das amarras dos preconceitos, do peso que carregamos. Quando somos brutalmente desafiados a lutar contra nós próprios, contra crenças enraizadas profundamente, começamos a questionar o que nos rodeia. Primeiro, a dependência, sabermos que não podemos olhar só para nós, porque outros, seres imaturos, indefesos, desprotegidos, precisam de nós, dos nossos cuidados, atenção e sobretudo amor. Depois, o espaço, aprender a ter o nosso espaço dentro do colectivo, adaptarmos as nossas vidas a novas necessidades. Claro que podemos não aprender nada com isto, ganhar muito dinheiro, arranjar uma boa ama, uma empregada e uma casa maior.

No entanto, o verdadeiro desafio é a mudança, criar espaço dentro do que já existe, simplificar, deixar para trás, organizar horários, criar rotinas e novos hábitos. Quando chegamos a este ponto estamos verdadeiramente preparados para viver a restante metade das nossas vidas, pelo menos a expectável e com qualidade mental. Sabemos o que nos agrada, o que nos faz sentir bem, o que nos perturba e o que devemos evitar. Sabemos as horas de sono que devemos dormir, a quantidade óptima de exercício, o que vestir nas várias ocasiões, o que dizer, o que queremos ouvir, e acima de tudo sabemos aceitar.

Não me sinto mais sábia, mais ponderada ou determinada, como também não sinto que tenha desperdiçado o meu precioso tempo de juventude, sinto que estive num processo de aprendizagem, que é contínua, aprendi muito, umas vezes acertei, muitas outras errei, mas continuo a querer fazer mais e melhor, com mais leveza, com mais certeza que o caminho é o que realmente importa e não tanto os objectivos que o definem.

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