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Delito de Opinião

Ética em combustão acelerada

Pedro Correia, 31.07.19

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O filho do secretário de Estado da Protecção Civil é sócio de uma empresa que celebrou vários contratos com entidades públicas, um dos quais por ajuste directo, num valor global superior a dois milhões de euros - situação expressamente proibida pela lei que regula as incompatibilidades dos titulares de cargos políticos.

O Governo adquiriu por mais de 300 mil euros e fez distribuir pelo País, via Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), milhares de estojos anti-incêndios - com material inflamável - produzidos por uma empresa de que é proprietário o marido de uma autarca socialista e que foi recomendada à ANPC pelo líder do PS no concelho de Arouca, também adjunto do gabinete daquele secretário de Estado, que até Setembro de 2017 presidia ao mesmo município.

Confrontado com estas notícias, o governante resiste a apresentar o pedido de demissão. Seguindo os péssimos exemplos da anterior ministra da Administração Interna e do anterior ministro da Defesa, que se agarraram até ao último momento ao umbral do portão governativo no rescaldo da tragédia de Pedrógão e da farsa de Tancos. Um e outro só acabaram por sair devido à pressão directa do Presidente da República.

 

2

Vivemos dias de lassidão ética e moral, com reflexos nas mais recentes notícias referentes à contínua diluição de fronteiras entre o exercício de funções políticas e a manutenção de interesses privados na órbita do Estado. Acompanho tudo isto, como a generalidade dos portugueses, e não posso deixar de fazer comparações. Quando António Guterres era chefe do Governo, por exemplo, dois ministros (Murteira Nabo em 1995 e António Vitorino em 1997) demitiram-se mal surgiram notícias alusivas à alegada falta de pagamento de um imposto entretanto abolido, a sisa, e um terceiro (Jorge Coelho) cessou funções em 2001, na própria noite em que ocorreu a tragédia de Entre-os-Rios, de que resultou a morte de 59 pessoas - número inferior às 116 vítimas mortais registadas nos incêndios de Junho e Outubro de 2017.

Outros tempos, outros modos. Outra noção dos princípios éticos e da responsabilidade pública.

 

ADENDA: Estado contratou o pai, a mãe e o irmão da ministra da Cultura.

4 comentários

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    Pedro Correia 31.07.2019

    Não sabia que havia uma "ética de esquerda" e uma "ética de direita".
    Quem começa a levantar marcos topográficos à ética começa a despedir-se dela.
  • Pedro, o PS, como bem sabe, é no essencial um Cenáculo das Más Andanças.

    Do excelente Luís Rosa:

    O PS prepara-se para tentar cumprir o seu duplo sonho desde 1975: domesticar o Ministério Público, tal como gosta de domesticar os contra-freios da democracia, e promover a mexicanização do regime.

    Porque se o PS quisesse, de facto, combater a corrupção não permitira que a Polícia Judiciária (que depende do Ministério da Justiça) fosse obrigada a escrever estes textos nos autos de uma investigação económico-financeira: “(…) inexistem, por ora, quaisquer condições para dar início à presente investigação, em face das graves carências de recursos humanos nesta Secção Central e das elevadas pendências de inquéritos registadas” — como já pude constatar em diversos inquéritos criminais que consultei.


    https://observador.pt/opiniao/e-obvio-que-o-ps-nao-quer-lutar-contra-a-corrupcao/

    ESTA MERECE MAIÚSCULAS.


    Funcionário do PS terá desviado 369 mil euros do Parlamento Europeu entre 2014 e 2016. Na mesma altura, direção do PS pedia ajuda financeira de "emergência" a eurodeputados do PS.

    https://observador.pt/especiais/auditoria-do-ps-reforca-desvio-de-fundos-no-parlamento-europeu-afinal-foram-mais-de-369-mil-euros/

    A um bom socialista, ou um de outra bandeira, a tribunos do povo, que venham por aí falar por e pelo povo deveria ser-lhe reservada uma acertada bastonada.

    Parece que, desde então, o PS já respira desafogado.

    https://zap.aeiou.pt/ps-quase-triplicou-lucros-psd-prejuizo-204901

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    Pedro Correia 31.07.2019

    Excelente jornalista, o Luís Rosa. Nisso estamos de acordo.
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