Emoções #4
Piadas com piada
Amanhã vou a Évora.
E como tantas vezes, em tantas circunstâncias idênticas ou díspares, a frase “mas a minha mãe foi a Évora" pinta-me um sorriso rasgado. Não só por me recordar de momentos familiares divertidos, de rever ou reouvir “A história da minha vida", mas também por me relembrar tempos mais negros, quando a necessidade aguçava o engenho, a piada não era apenas um triste e fácil palavrão, tinha conotações sociopolíticas e nos obrigava a pensar.
O meu pai adorava o teatro de revista. Compravam-se bilhetes de frisa para o Maria Vitória e de vez em quando eu era contemplada com uma ida à revista.
Relembro com agrado os momentos deliciosos, plenos de hilariantes diálogos carregados de inteligentes subentendidos que satirizavam a sociedade portuguesa e o que se passava fora de portas, e principalmente a classe política. Em tempos de censura a criatividade era absolutamente fabulosa.
Do alto dos meus 14 anos, na primeira vez que fui à revista, não alcancei o motivo de tantas gargalhadas até às lágrimas, mas aprendi com o tempo.
É sempre uma emoção recordar a emoção que era repetir, sabendo que se estava a transgredir.
É sempre uma emoção rir do riso inteligente e franco que nos proporcionavam.
Nomes como os de Henrique Santana, Eugénio Salvador, Raul Solnado, Ivone Silva, Óscar Acúrcio, Vítor Mendes e tantos outros fazem parte do meu imaginário de adolescente no regime, em transição para a liberdade.
É verdade que rir é o melhor remédio mas há rir e rir. Piadas muito giras, cheias de vulgaridades obscenas, funcionam por meia dúzia de vezes. Depois é mais do mesmo e deixa de ter, ou ser, piada. Outras piadas há que pelo seu burilado se tornaram intemporais e essas é sempre emocionante recordar.
Entender a brejeirice dos diálogos, dos monólogos, das letras das músicas era uma emoção que me emociona até hoje.