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Delito de Opinião

Eleições na Madeira

jpt, 28.09.23

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As eleições na Madeira já foram esmiuçadas pela imprensa e locutores políticos. E nas tertúlias que ainda se dedicam às coisas da política nacional. Um amigo que tem a gentil paciência de me ler nos blogs pergunta-me se não direi nada sobre o assunto. Não conhecendo eu o contexto - lamentavelmente não vou à Madeira desde 1993 - nem tendo acompanhado as notícias que poderei eu dizer? Ou melhor, que poderei eu dizer que não tenha já sido dito? E, ainda mais, que não tenha eu já dito?

Sobre os resultados das eleições há dados que são  factos, transcendendo o estatuto de mera opinião: há meio século que o PSD governa a região, o que demonstra ter alguma virtude nisso, por mais críticas que possam ser feitas aos seu sucessivos governos. Agora ficou resvés a maioria absoluta - olhando para os resultados presumo que com mais cerca de 700 votos a teria alcançado. O PS teve uma enorme quebra, uma estrondosa derrota eleitoral. O parlamento regional pluralizou-se, nisso seguindo o que vem acontecendo no nacional - pois longe estão os tempos dos quatro partidos e das imensas lérias sobre as vantagens da "bipolarização", que tantos aldrabões políticos propagavam no final de XX. O CHEGA teve um grande crescimento, sublinhando o seu estatuto de terceira força política nacional.

Depois há opiniões, "cada cabeça sua sentença". A fragmentação do parlamento regional poderá também ter sido causada pelas lideranças das várias listas candidatas. As representações dos pequenos partidos poderão ter sido possibilitadas por alguma abstenção entre os eleitores atreitos à coligação PSD/CDS, provocada pelas sondagens que anunciavam grande vantagem. Há uma grande deslocação de eleitores para o amplexo centro-direita. O eleitorado do CHEGA é constitutivo da nossa sociedade e não pode continuar a ser demonizado e as suas preocupações pontapeadas. As novas direcções dos já institucionalizados PCP e BE não tiveram efeitos relevantes no eleitorado madeirense - ainda que tal possa ter sido apenas provocado pelas listas locais. As preocupações com as alterações climáticas no seio da população urbana continua a favorecer o atrapalhado PAN, que se reclama ecológico.

E há dúvidas, também cada um terá as suas. Antes de tudo, não faço a mínima ideia do que seja o regional JPP. Será o CDS ainda existente no arquipélago? De qualquer forma o seu novo líder foi engolido na arena comunicacional, tendo uma vitória eleitoral mas uma relativa derrota política. E os arranjos governativos têm também um sabor amargo para esse CDS: o líder da coligação regional anunciou um acordo governamental com a nova deputada do PAN. E logo se sabe que esta tem um programa radiofónico (isso a que agora se chama podcast, sabe-se lá porquê) dedicado a temas antes ditos "fracturantes", educação cívica e sexualidade, e sobre esta fala com (saudável) liberalidade lexical e temática. Como reagirão as "massas" antes ditas "demo-cristãs", sempre filiadas no seu valor fundamental "vícios privados, públicas virtudes"? Ou, para falar como a nova deputada do PAN,  parece-me que na Madeira "meteram no dedo no cu do CDS".

E a minha principal dúvida após estas eleições. Muito lamento o baixo crescimento "da" (é um partido, deve ser dito "do" mas cedo aos usos consagrados pelo vulgo) Iniciativa Liberal. Pois não sendo eu um fiel do deus Mercado desde há anos que julgo aquilo que o socialista Sérgio Sousa Pinto há pouco foi dizer a uma associação portuense: neste Portugal tão estatista é urgente fazer um caminho conjunto com os liberais. E ciente de que - ao contrário do que dizem muitos mariolas socratistas, perdão, socialistas e os militantes dos partidos comunistas parlamentares - o liberalismo foi e é estruturante das democracias europeias e da União Europeia, e não um corpo estranho e inimigo. Ora esse fraco crescimento da IL poder-se-á dever a uma pobre escolha local. Mas mesmo que assim seja aparenta algo que penso, a nova liderança do partido não é uma escolha de sucesso. Há meses um amigo, pertencente ao partido, respondia ao meu torcer de nariz dizendo-me que Rui Rocha "segurara o partido". Restringi-me a mais um gole (ainda para mais ele convidara-me para o jantar) não lhe respondendo o óbvio, que  isso é um argumento de partido do poder, instituído (um PS, um PSD), preocupado com o agregar das suas esfaceladas "bases". Mas nunca argumento positivo para um partido em crescimento, e de relativa ruptura.

Finalmente, uma opinião minha que é também facto. Pela primeira vez em meio século um presidente do PSD foi à Madeira acompanhar as eleições, nitidamente em busca de ser aspergido por uma vitória retumbante. O PSD teve uma boa vitória, ainda que não óptima. O seu directo rival PS teve uma derrota estrondosa. E a sensação generalizada - que não se deve apenas ao trabalho de uma comunicação social enviesada - é a de uma relativa derrota social-democrata e de uma verdadeira derrota do seu líder nacional. Ou seja, pode-se dizer que as novas lideranças dos pequenos partidos (IL, BE, PCP, CDS) não demonstraram ter tido efeitos positivos eleitorais. Mas tem de se sublinhar que a (já não tão) nova liderança do PSD não teve efeitos positivos eleitorais e tem efeitos políticos negativos.

Em Janeiro de 2023 aqui deixei um postal sobre Luís Montenegro: "O complexo Silas". Com todas as crises internas ao governo PS e todo o tempo que o presidente do PSD tinha tido para preparar a sua agenda política, era já óbvio que Montenegro é uma espécie de Jorge Silas - o treinador de futebol que o Sporting contratara, crendo-o e anunciando-o como "the next big thing". E que veio a falhar rotundamente, por causas próprias e alheias. E passado quase um ano, com mais um rosário de trapalhadas governativas e em plena crise económica mundial, o rumo do presidente do PSD sublinha a já antiga evidência: Luís Montenegro é um Jorge Silas da política nacional.

O PSD que se cuide. Pois o país precisa de uma oposição forte. E inteligente.

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