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Delito de Opinião

Eduardo Pitta

jpt, 26.07.23

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Morreu ontem Eduardo Pitta, poeta, ficcionista, crítico literário. E também bloguista. Encetado em 2005 o seu Da Literatura era um dos blogs relevantes na época vibrante da "blogosfera" e Pitta manteve-o activo até recentemente - infelizmente retirou dos arquivos a primeira década do blog. Nele compôs uma mescla de atenção a factos culturais com uma intervenção política. Nascido em 1949 na então Lourenço Marques, Pitta tinha interesse pelos processos moçambicanos. Foi isso que o fez conhecer o meu ma-schamba, que fora o primeiro blog em português escrito no país e que quando ele começou a blogar era ainda um dos poucos ali existentes. Foi afável comigo, num companheirismo bloguístico então comum, e estabeleceu até uma correspondência - lembro que teve a gentileza de me enviar por via postal o seu ensaio "Fractura : a condição homossexual na literatura portuguesa contemporânea". E explicou-me também as razões, mais do que curiais e sem qualquer acinte, que o haviam conduzido a recusar a proposta feita por intelectuais moçambicanos para o inserir no cânone do historial da literatura daquele país - não estou a ser indiscreto, desvendando correspondência privada, pois lembro-me de ter lido declarações suas sobre o assunto. Era essa, apesar do prazer havido com a atenção recebida, uma opção que fundava em termos de identidade pessoal e não de postura político-ideológica.

Depois vieram os anos da crescente degenerescência socratista. No seu blog Pitta foi um dos muitos que manteve não só o proselitismo socialista como a defesa arreigada do então primeiro-ministro. O Da Literatura continuava interessante, elegante e informativo - principalmente para quem estava fora do país. Mas, exasperado com o "estado da nação" e com a cumplicidade de um largo sector da intelectualidade portuguesa com aqueles desmandos antidesenvolvimentistas - a qual raiava o absurdo na "blogosfera" -, deixei de acompanhar a sua actividade. Como a de vários outros desse eixo político, habitualmente bem menos interessantes. 

As notícias de ontem e hoje sobre a morte de Pitta sublinham a sua importância no âmbito de uma literatura homossexual portuguesa - estatuto que ele próprio acarinhava, explicitando a necessidade de afirmação literária dessa temática. Eu sou pouco sensível a essa catalogação. E insisto naquilo que lhe disse e escrevi em pequeno postal, em texto que julgo lhe terá agradado, ainda que seja uma leitura arredia dessa peculiar atenção identitária que lhe dão: o seu breve "Persona" é o grande texto literário português sobre o final do regime colonial em Moçambique - e se calhar até mais do que isso (o  meu texto sobre o "Persona" está aqui). E, mais uma vez, proponho a leitura desse belo livro.

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