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Delito de Opinião

Doutrinas de defesa europeias

João André, 11.12.14

Neste post do Luís, o nosso comentador habitual luckylucky levanta uma questão interessante: «A União começou desenvolvimento de mísseis nucleares de curto alcance [do tipo] que os Russos têm milhares?».

 

Esta é uma questão interessante porque, da forma como a leio, toca a famosa doutrina MAD (nunca um acrónimo foi melhor escolhido). Nela o conceito era o de dois estados em conflito (EUA e URSS) terem o poder de se destruir mutuamente, assim assegurando que nunca o fariam. Essencial para a doutrina eram dois aspectos: 1) a capacidade de saber que a morte vinha a caminho, i.e., que os mísseis tinham sido lançados pelo outro lado, o que permitiria lançar os próprios; 2) a certeza que o outro lado seria capaz de lançar os seus próprios mísseis.

 

Claro que existiam várias considerações morais subjacentes a este aspecto, sendo que uma delas era o conceito de destruir duas centenas de milhões de vidas com uma ordem (ou, no sentido mais figurado, com o premir de um botão). Outro aspecto mais delicado era a decisão de o fazer sabendo que isso não traria qualquer vantagem (atacando primeiro estar-se-ia a assegurar a própria destruição e em segundo o ataque nada traria além de uma vingança que ninguém saborearia). Em qualquer dos casos, muito poder estava nas maos dos chefes de estado de cada um dos países (mesmo que diluído por conceitos como a "regra dos dois homens" americana).

 

Transportando este conceito para a Europa é possível que tal doutrina de nada serve. Não há uma única pessoa que possa "premir o botão". Se não há uma pessoa que possa atender um telefone, a outra decisão - ou escolher quem a toma - é impossível. Além disso há países que neste momento e por princípio rejeitariam tal solução - a Alemanha é um deles. Há além disso outro problema: se os EUA são um país onde um presidente necessita de demonstrar ser capaz de ser um "duro", na Europa tal comportamento seria aceitável apenas em alguns países. Ou seja, num momento de decisão sobre um hipotético ataque, um líder externo saberia que a probabilidade de sofrer uma retaliação maciça seria baixa.

 

É por isso que a Europa necessita de ir jogando cartas diplomáticas no que diz respeito à sua defesa. Não pode depender de uns EUA que só defenderão os europeus na medida que isso sirva os seus interesses (que são poucos, neste momento) e não creio que alguma vez será capaz de jogar a cartada MAD contra ninguém (a UE desintegrar-se-ia antes de isso ser possível). Por muito que os falcões europeus o desejem, a Europa está consignada à diplomacia e às influências económicas. E até ao momento isso ainda não resultou em nenhuma irrelevância.

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