Cadernos de um enviado especial ao purgatório (13)
Um Homem Muito Procurado é o mais recente filme baseado num romance de John Le Carré. Ainda não vi, mas espero que faça justiça à obra literária e a escolha do falecido Philip Seymour Hoffman para o papel de Gunther Bachmann parece garantia de qualidade. Na complexa geopolítica de John Le Carré, este é o romance da guerra contra o terror, com uma curiosa legião de perdedores, incluindo o banqueiro desiludido, o fugitivo com problemas de identidade, a advogada idealista e o espião à moda antiga desadaptado à nova ordem, que parece calhar a Hoffman como uma luva. Le Carré consegue casar a guerra fria e o extremismo islâmico, mas a sua teia de intriga leva-nos aos territórios pantanosos da rivalidade internacional e da alta finança. Em música de fundo, o desconhecimento ocidental sobre os movimentos radicais islâmicos, com críticas ácidas à estratégia americana na chamada luta contra o terror. Temo que o filme possa menorizar a notável figura do banqueiro, Tommy Brue, personagem repleta de subtilezas, que enfrenta conflitos interiores difíceis de explicar em cinema, mas que o romancista transforma numa complexa filigrana de motivações pessoais e procura da redenção. No fundo, o banqueiro e o “terrorista” têm dois pontos em comum: a sombra do pai e a atracção impossível pela advogada. O jovem Issa Karpov, o homem muito procurado, vem da Chechénia, território que curiosamente deixou de ser notícia, mas onde a Rússia fez uma cruel defesa do seu império, radicalizando a população islâmica. Le Carré, um mestre da narrativa, é também um profundo conhecedor deste conflito. Os filmes baseados na sua obra costumam ser bons, mas os enredos são complexos e têm muita informação, o que não se compadece com a linguagem de Hollywood e o ritmo da hora e meia.