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Delito de Opinião

Cadernos de um enviado especial ao purgatório (6)

Luís Naves, 01.08.14

Em Bloguítica, Paulo Gorjão defendera esta escolha muito antes dos outros. Carlos Moedas tem tudo para ser um bom comissário europeu. Infelizmente, tirando alguns exemplos de lucidez, o debate político gerado pelo anúncio deste nome insiste na pobreza habitual, que em vários casos revela desconhecimento do próprio funcionamento interno da União Europeia. Há pessoas que imaginam uma Europa que não existe e, por isso, continuam a não perceber a realidade. Como diria Robert Heinlein, “a vida é o que é e não perdoa a ignorância”.

O que mais me espanta, neste caso, é o argumento de que devia ter sido escolhida uma mulher e, de preferência, uma mulher socialista; a pasta atribuída ao país seria assim muito melhor. A ser verdade, isto era inadmissível, pois os comissários são escolhidos pelos governos. Existe negociação, é certo, envolve o perfil das pessoas e as suas competências, mas esta é uma atribuição dos Estados. A imposição de um perfil seria mais um passo no sentido do directório. Ninguém imagina o presidente da comissão a fazer este número com a chanceler Merkel: "envie uma mulher e recebe uma pasta melhorzinha".

O novo presidente da Comissão, Jean-Claude Juncker, acha que é inovador, a ponto de considerar que as eleições europeias lhe davam legitimidade para o cargo, e agora queria inovar em matéria de comissários, estabelecendo quotas para género e eventualmente para credos religiosos, minorias étnicas e outras novidades. Portugal recebia um doce se enviasse uma mulher, mas apesar dos abracinhos e beijinhos, isso não era bem assim, a negociação foi mesmo sobre lugares para os países: os grandes ficam com as pastas importantes e os outros repartem o que sobra.

Os socialistas portugueses, em campanha interna, aproveitaram a escolha de Moedas para agitar o consenso europeu e defendem uma tese do outro mundo, que devia ter sido escolhida uma mulher socialista, embora o governo seja de centro-direita e tenha disponível uma pessoa competente da sua área política.

Os que criticam Passos Coelho por alegada submissão aos poderes da Europa são afinal os mesmos que queriam ver o Governo português a ceder a uma sugestão que certamente nunca foi feita aos Estados mais fortes da UE: "se mandarem uma mulher em vez de um homem, a vossa pasta é muito melhor".  

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