Diário semifictício de insignificâncias (19)
O homem foi no carro dele, eu segui-o no meu. Ainda dentro da povoação, um semáforo accionado pela velocidade passou a vermelho. Ele ignorou-o. Eu parei. Quando surgiu a luz verde, arranquei devagar. O homem esperava mais à frente. Era dos que aceleram nas rectas e travam demasiado nas curvas. Antes de chegarmos ao destino, ignorou mais dois semáforos. Despoletava a mudança mas não fazia caso. Eu parava. Ele encostava na recta seguinte.
Primeiro, fiquei irritado. Depois comecei a divertir-me. Perguntei-me se ele não teria consciência da acumulação de situações, perdendo a memória do sucedido num semáforo antes de atingir o seguinte (o que faria dele uma espécie de Dory, em À Procura de Nemo), ou se, depois do primeiro semáforo, achava agora que parar ou conduzir mais devagar representaria perder a face. Podes armar-te em cumpridor das regras, pensaria, mas eu não vou mudar por tua causa.
Estacionámos lado a lado. Saímos dos carros e fingimos que nada acontecera.