Diário semifictício de insignificâncias (32)
Fecho o Kindle. Acho que suspiro (mas talvez não, que seria má literatura). Isto de ler livros electrónicos - cada vez mais, graças ao maravilhoso Acordo Ortográfico -, e de a Amazon fazer promoções a dois e três dólares por livro, leva-me a experimentar autores que tenho quase a certeza de não ir apreciar. O prazer da confirmação é nulo ou, pelo menos, está longe de compensar outra sensação, antiga e insidiosa: a maior vergonha nem é todos os livros que não li e devia ter lido, mas os que li no lugar deles.
Possuo uma desculpa, todavia, quase tão antiga mas bastante menos espontânea: são estas derivas (dos clássicos para o mainstream, do mainstream para os nichos, dos nichos para o experimentalismo) que, na literatura, no cinema, na música, na arte, na gastronomia, até no vestuário, tornam cada pessoa única. Se todos lêssemos, ouvíssemos e víssemos o mesmo, ainda que esse mesmo fosse o melhor em cada campo, que piada teria o mundo?
Evidentemente, não resulta. Continuo a sentir-me um idiota. Muito pouco singular e, graças aos esforços para acreditar na desculpa, até um nadinha ridículo.