Diário semifictício de insignificâncias (23)
Assisto na televisão às reportagens sobre mais um atentado. Há corpos no chão, um herói improvável e inglório, a estupefacção do costume, não obstante a falta de novidade. Por entre cuidados de linguagem (a jornalista da CNN esforça-se por tentar saber se o que permite às autoridades falarem em terrorismo é a origem ou a religião do atacante sem usar termos como «árabe» ou «muçulmano»), reporta-se que o número de mortos e feridos é provisório. A informação permite manter aquela expectativa doentia em que se deseja simultaneamente o menor e o maior número possível. Pergunto-me o que diferenciará tragédias grandes de tragédias pequenas. O número de mortos? As circunstâncias? O nível de incongruência ou de crueldade? Mas talvez essa seja a forma errada de classificar as tragédias. Talvez seja mais exacto - e mais fácil - dividi-las em tragédias públicas e tragédias íntimas. As primeiras estão cheias das segundas, mas raramente lhes fazem jus: o espectáculo e a cacofonia (ainda que baseada nas melhores intenções) nunca o permitem.
Mudo para o Eurosport.