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Delito de Opinião

Dia Mundial da Trissomia 21

Francisca Prieto, 21.03.16

Hoje é Dia Mundial da Trissomia 21 e da maneira como embirro com dias mundiais de coisas, seria normal não ligar nenhuma à data. Mas a verdade é que os cromossomas a mais da minha filha Francisca me fazem olhar de uma forma diferente para este dia. Porque ainda há muita mata para desbravar até que deixe de ser necessário gritar pelos direitos irrefutáveis destas pessoas.

 

Tive sorte. Quando ela nasceu ouvi muitas vezes falar dos olhares de soslaio de que estas crianças eram vítimas, da dificuldade de integração na escola regular, da falta de fé nas suas capacidades e na tendência vigente para serem consideradas cidadãos de segunda. Tive sorte, repito, porque nunca senti olhares preconceituosos. Pelo contrário, senti muitos olhares, mas sempre de curiosidade ou de simpatia, por verem uma miúda com Down a comportar-se de uma forma tão desconcertantemente normal. Da mesma forma, também tive uma sorte tremenda na escola que ela frequenta. Ao invés de me apresentarem problemas, sempre me ajudaram a encontrar soluções e sempre acreditaram que ela era capaz de feitos extraordinários. A prova é que, ao dia de hoje, com dez anos, a Francisca lê na perfeição, escreve e até faz composições simples sobre os assuntos que lhe interessam lá na sua vida.

É sempre convidada para as festas dos colegas e até tem um par de amigas do coração que disputam festas do pijama ora em casa de uma, ora em casa de outra. A nenhum pai vi alguma vez qualquer demonstração de desagrado por ter de a receber em casa. Pelo contrário, são sempre o cúmulo da simpatia e acham um piadão ao seu sentido de humor.

Uma vez disse-me que queria montar a cavalo. Lá arranjei maneira de a inscrever numa escola de hipismo durante as férias, onde ficava todo o dia. Quando a ia buscar, os professores contavam-me sempre grandes aventuras e o que é certo é que conseguiram pôr a rapariga a galopar num par de semanas.

Também foi para as Guias, com a irmã. É a animadora do bando das avezinhas e assim que lhe falaram em acampamento, lá estava ela na linha da frente, pronta para pôr a mochila às costas. As chefes nunca tiveram um momento de hesitação e sempre a receberam com a mesma alegria com que receberiam qualquer criança.

 

Mas sei que, infelizmente, ainda não é assim para todos. Que, na maior parte dos casos, as escolas olham para estas crianças como um fardo em vez de um desafio, que noutros agrupamentos de Guias ou Escuteiros disseram peremptoriamente aos pais que não tinham capacidade para as receberem, que nos cavalos as colocam em aulas de hipoterapia em vez de em classes regulares e que em muitos casos, nunca, mas nunca, são convidadas para festas.

 

É por isso que, apesar da sorte que tenho tido, tenho de marcar o dia 21 de Março como um dia para defender o direito à igualdade na diferença. Porque nem todas as famílias tiveram a sorte de encontrar pelo caminho pessoas do calibre das que nós temos encontrado. Das que acreditam que está nas suas mãos fazer a diferença.

 

Xiquinha no Estádio da Luz.jpg

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