Dez livros para comprar no Natal
Livro um: Quando a TV Parava o País, de João Gobern
Edição Matéria-Prima, 2016
228 páginas
A nostalgia salutar nunca deve confundir-se com saudosismo. Praticá-la é um estimulante exercício da nossa memória mais ligada aos afectos, não podendo confundir-se com a mórbida tentativa de aprisionar o passado no presente, ignorando o curso do tempo.
João Gobern propõe-nos neste livro uma refrescante digressão pelas suas memórias televisivas – que é afinal uma forma de prestar tributo aos primeiros 35 anos de existência da RTP. De 1957, ano da fundação da televisão em Portugal, a 1992, quando surgiu o primeiro canal privado e o serviço público foi ganhando contornos cada vez mais imprecisos.
Jornalista experiente e observador arguto, Gobern não esconde uma predilecção pela RTP, onde mantém presença regular como colaborador. E exprime sérias reservas quanto ao rumo que a televisão tem tomado nas duas últimas décadas entre nós.
“Todos estamos gratos pelo que chegou de bom. Mas não sigamos a avestruz: nunca a TV – mesmo no tempo da Censura, que marcou presença nos seus primeiros 17 anos – foi tão boçal, tão dogmática, tão oportunista, tão selvagem, tão consumista, tão invasora, tão medíocre, tão desleal, como de 1992 para cá”, escreve o autor num contundente posfácio a Quando a TV Parava o País.
A tese é polémica – e, até por isso, justifica reflexão. Mas o fascínio desta obra é proporcionar-nos uma visita guiada à televisão dos tempos pioneiros – e, com ela, esboçar-nos também um retrato impressivo do País. Com as suas luzes, as suas sombras, os seus equívocos, os seus acertos, as suas fugazes vedetas, as suas duradouras celebridades.
É sobretudo um relato geracional – a da geração do autor, que é também a minha, primeira que cresceu em Portugal com um televisor instalado num espaço nobre lá de casa. Tempo do preto e branco, que só em 1980 cedeu lugar à cor. Tempo em que um festival de música ou um episódio de telenovela eram vistos ao mesmo tempo por toda a gente, pondo o País a mirar aquela caixa que mudou o mundo. Nostalgia mais saudável não há.