Dez livros para comprar na Feira
Livro quatro: Páginas de Melancolia e Contentamento, de António Sousa Homem
Edição Bertrand, 2013
228 páginas
De vez em quando surgem cronistas inesperados na imprensa portuguesa. Fogem do óbvio, do trivial, do previsível. São personagens, no mais lídimo significado da palavra. Interessa-nos tanto aquilo que têm para nos dizer como a forma como dizem – o estilo, a sintaxe, o vocabulário, o imaginário. São originais, em suma. O que nem sempre granjeia popularidade nesta época do pronto-a-pensar, em que quase todos os colunistas da imprensa parecem plagiar-se, cultivando a arte de muito escrever sem nada dizer.
Felizmente há quem teime em fugir ao molde. Como leitor impenitente de jornais, fui conhecendo alguns através dos anos. Artur Portela e a sua verve cristalina. Mário Castrim e os seus verrinosos neologismos. Jorge Listopad e as suas metáforas inconfundíveis. Eduardo Prado Coelho e a sua erudição sem par. Manuel António Pina e a sua perene mordacidade.
Há três décadas, estiveram em voga no extinto Semanário os ‘Bilhetes de Colares’ de um tal A. B. Kotter. Prosa de primeira água, produzida por um suposto cidadão britânico radicado em Portugal. Especulou-se tanto sobre a identidade desse autor como a deste que hoje vos recomendo: António Sousa Homem, octogenário ancorado em Moledo, fiel aos pergaminhos familiares e avesso aos ventos da modernidade, auto-intitulado “reaccionário minhoto” neste volume que recolhe crónicas inseridas no Correio da Manhã e merece ser saboreado com um vagar propício às tardes de Verão.
Mais do que um autor, Sousa Homem é uma figura interessantíssima que vai ganhando forma a partir de pistas fornecidas nos seus textos. E não vem só: traz com ele uma estimulante galeria de personagens secundárias por quem vamos ganhando apreço e afecto.
Sempre com suavidade no trato, sempre com saudável incorrecção política, sempre com apego ao idioma que funciona como traço de união entre todos nós.