Dez livros para comprar na Feira
Livro quatro: Autocracia Inc., de Anne Applebaum
Edição Bertrand, 2024
192 páginas
Caminharemos de modo irreversível para um mundo iliberal, onde autoritarismos de diversos matizes impõem a lei da força? Historiadora e jornalista, especializada na investigação de temas ligados à Europa de Leste e à Rússia, a norte-americana Anne Applebaum era repórter da revista britânica The Economist quando caiu o comunismo na Polónia, início da derrocada da Cortina de Ferro. Foi colunista do Washington Post e editora-adjunta da revista The Spectator, hoje escreve ensaios noutra publicação de referência: The Atlantic. Em 2004 recebeu o Prémio Pulitzer de não-ficção por Gulag: Uma História, assombrosa descida ao inferno dos campos da morte soviéticos.
Autocracia Inc. toma como ponto de partida a brutal agressão da Federação Russa à Ucrânia, em Fevereiro de 2022, com Vladimir Putin a tentar impor um anacrónico e aberrante "direito de pernada" ao Estado vizinho, combinando a lógica feudal do czarismo com o impiedoso desprezo pela vida humana que Estaline sempre evidenciou.
«Prenderam funcionários do governo e líderes cívicos: presidentes de câmara, polícias, directores de escolas, jornalistas, artistas, conservadores de museus. Construíram câmaras de tortura para civis na maior parte das povoações que ocuparam no sul e leste da Ucrânia. Raptaram milhares de crianças, arrancando algumas aos braços das famílias e retirando outras de orfanatos, deram-lhes novas identidades "russas" e impediram o seu regresso à Ucrânia. Atingiram deliberadamente os trabalhadores dos serviços de emergência. Varrendo para um canto os princípios de integridade territorial que a Rússia tinha aceitado na Carta das Nações Unidas e nos Acordos de Helsínquia, Putin anunciou, no Verão de 2022, a sua intenção de anexar território que o seu exército nem sequer controlava» (pp. 21-22, tradução de Joaquim Gafeira.)
Este ensaio é uma lúcida, apaixonada e vibrante defesa da democracia liberal num mundo em que a ameaça dos regimes autocráticos se consolida em diferentes latitudes. Da Bielorrússia onde vigora a mais velha ditadura da Europa à Venezuela chavista hoje transformada em narco-Estado sob a força dos fuzis, sem esquecer a anquilosada teocracia iraniana, especializada em enforcar jovens que se atrevem a contestar os dogmas islâmicos e em torturar mulheres por ousarem sair à rua de cabelo descoberto.
Applebaum não tem dúvidas: estamos hoje ameaçados por um implacável eixo de autocracias com características divergentes mas unidas pelo ódio à liberdade. Estes regimes cultivam afinidades com Estados onde os mecanismos formais da democracia se mantêm, embora em situação precária: Turquia, Israel, Hungria, Índia, Filipinas. Assim se desenha uma nova geopolítica, marcada pelo condicionamento ou supressão de direitos fundamentais. Na actual circunstância, impõe-se uma palavra de ordem: resistir. Obras como esta são passos fundamentais no combate ao despotismo global.
Sugestão 4 de 2016:
Páginas de Melancolia e Contentamento, de António Sousa Homem (Bertrand)
Sugestão 4 de 2017:
Os Filipes, de António Borges Coelho (Caminho)
Sugestão 4 de 2018:
Não Respire, de Pedro Rolo Duarte (Manuscrito)
Sugestão 4 de 2019:
Dois Países, um Sistema, de Rui Ramos e outros (D. Quixote)
Sugestão 4 de 2020:
Que Nós Estamos Aqui, de João Tordo (Fundação Francisco Manuel dos Santos)
Sugestão 4 de 2021:
Uma História da ETA, de Diogo Noivo (E-primatur)
Sugestão 4 de 2022:
História de um Homem Comum, de George Orwell (E-primatur)
Sugestão 4 de 2023:
Biblioteca Pessoal, de Jorge Luis Borges (Quetzal)
Sugestão 4 de 2024:
Tempestades de Aço, de Ernst Jünger (Guerra & Paz)