Dez livros para comprar na Feira
Livro dois: Bambino a Roma, de Chico Buarque
Edição Companhia das Letras, 2025
169 páginas
Chico Buarque, desenrolando o fio da nostalgia, lembra-nos os dias felizes vividos em Roma com os pais e os seis irmãos entre 1953 e 1955 – dos 9 aos 11 anos. O autor de “Tanto Mar” não mergulha a fundo, permanecendo quase só à superfície, mas é quanto basta para atrair o leitor nesta sedutora viagem no tempo a um bairro da Cidade Eterna em morada que jamais esqueceu: apartamento 2, um rés-do-chão na Via Marino, 12. Revisita-a 70 anos depois. Remontando àqueles dias irrepetíveis em que cozinheiras da Sardenha confeccionavam petiscos regionais para a família Buarque e em que ele frequentava uma escola americana de orientação católica na capital italiana.
Acompanhamos o criador de “Construção” em imagens verbais que logo associamos aos filmes saídos dos estúdios da Cinecittà quando cineastas como Rossellini, Visconti, Fellini, Lattuada e Monicelli moldavam os novos ídolos da Sétima Arte. Não falta sequer a aparição de Alida Valli, diva daquela fábrica de sonhos, sua inesperada parceira de dança. Em prosa contaminada pela toada poética, tão familiar ao criador de temas musicais que muitos sabemos de cor.
Foi lá que o menino Chico – Prémio Camões em 2019 - aprendeu a amar os livros como janelas abertas ao mundo enquanto o pai historiador, Sérgio Buarque de Hollanda, batia incessantemente à máquina no escritório lá de casa. «Também me serviu de passaporte a leitura dos livros italianos que roubei do meu irmão mais velho, a começar pelo Corsário Negro, de Emilio Salgari. Depois vieram O Filho do Corsário Vermelho, mais a A Filha do Corsário Verde.»
Foi lá que viu Pio XII: o Papa «dirigia ao público um sinal da cruz fatigado», parecendo «saído de um museu de cera». E aprendeu as primeiras palavras em italiano: calcio, pallone, fuorigioco, và a fancullo. E via Martine Carol nas matinés: dizia-se dela que era a actriz mais limpa de Paris «porque tomava banho em todos os seus filmes».
Foi lá que memorizou as primeiras canções. “That’s Amore”, interpretada por Dean Martin. Frank Sinatra e o seu “Young at Heart”. Leslie Caron no musical Lili popularizando “Hi-Lili, Hi-Lo” com sucesso imediato. «Eu tinha pressa de crescer e ser adulto e namorar mil e uma mulheres.»
O menos bom do livro é saber a pouco: chegamos depressa ao fim e fica a apetecer-nos mais.
Sugestão 2 de 2016:
Nada, de Carmen Laforet (Cavalo de Ferro)
Sugestão 2 de 2017:
Singularidades, de A. M. Pires Cabral (Cotovia)
Sugestão 2 de 2018:
Deuses de Barro, de Agustina Bessa-Luís (Relógio d'Água)
Sugestão 2 de 2019:
A Língua Resgatada, de Elias Canetti (Cavalo de Ferro)
Sugestão 2 de 2020:
Três Retratos - Salazar, Cunhal, Soares, de António Barreto (Relógio d'Água)
Sugestão 2 de 2021:
Presos por um Fio, de Nuno Gonçalo Poças (Casa das Letras)
Sugestão 2 de 2022:
Primeira Memória, de Ana María Matute (Narrativa)
Sugestão 2 de 2023:
O Plantador de Malata, de Joseph Conrad (Sistema Solar)
Sugestão 2 de 2024:
Kokoro, de Natsume Soseki (Presença)