Dez livros para comprar na Feira
Livro quatro: Biblioteca Pessoal, de Jorge Luis Borges
Reedição Quetzal, 2023
155 páginas
O último livro em que Jorge Luis Borges trabalhou, pouco antes de falecer, foi este guia dos seus gostos literários mais marcantes que funciona como bússola para o leitor comum. «Uma biblioteca de preferências», como salienta o autor no breve prólogo. Convicto, como havia escrito anos antes, que «todas as coisas do mundo conduzem a um encontro ou a um livro.»
Passam por aqui alguns clássicos, como seria de prever. Obras como As Mil e uma Noites, As Viagens de Gulliver, a Eneida, Os Nove Livros da História, de Heródoto, A Descrição do Mundo (Marco Polo), A Vida Amorosa de Moll Flanders (Daniel Defoe), Os Demónios (Dostoievski), dois títulos de Quevedo e um de Thomas de Quincey. Mas o século mais representado é aquele em que Borges (1899-1986) ganhou fama como um dos gigantes da literatura. Numa lista que privilegia o romance, mas sem excluir o conto (Voltaire, Poe, Kipling, Chesterton, Cortázar), o drama (Ibsen, Shaw, Eugene O'Neill), o ensaio (Oscar Wilde), a filosofia (Henry James, Kierkgaard), a literatura de viagens (Um Bárbaro na Ásia, de Henri Michaux) e até um dicionário de mitos gregos (compilado por Robert Graves).
Borges surpreende os leitores rejeitando escolhas óbvias. Kafka surge com América e não com O Processo; Melville é destacado com três títulos, nenhum deles Moby Dick; Flaubert está representado por A Tentação de Santo Antão em vez de Madame Bovary.
Já doente, foi ditando estas notas a Maria Kodama -- algumas tão sucintas que são meras fichas de leitura. A sua morte deixou o projecto amputado: em vez das cem previstas, ficaram 85. Incluindo menções a obras-primas como A Máquina do Tempo, O Deserto dos Tártaros, Pedro Páramo e O Coração das Trevas.
Para o leitor português, eis a notícia mais relevante: um dos livros destacados é O Mandarim, do nosso Eça de Queiroz. Devia a editora ter corrigido um grave erro factual: o autor d' O Aleph diz que Eça viveu na China, quando nem sequer andou lá perto. Mas Borges não lhe poupa elogios: garante que «cada oração [dele] foi limada e temperada, cada cena da [sua] vasta obra múltipla foi imaginada com probidade».
Lembra que Eça e Wilde morreram no mesmo ano, 1900. Eram «dois homens de génio», sem favor algum.
Sugestão 4 de 2016:
Páginas de Melancolia e Contentamento, de António Sousa Homem (Bertrand)
Sugestão 4 de 2017:
Os Filipes, de António Borges Coelho (Caminho)
Sugestão 4 de 2018:
Não Respire, de Pedro Rolo Duarte (Manuscrito)
Sugestão 4 de 2019:
Dois Países, um Sistema, de Rui Ramos e outros (D. Quixote)
Sugestão 4 de 2020:
Que Nós Estamos Aqui, de João Tordo (Fundação Francisco Manuel dos Santos)
Sugestão 4 de 2021:
Uma História da ETA, de Diogo Noivo (E-primatur)
Sugestão 4 de 2022:
História de um Homem Comum, de George Orwell (E-primatur)