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Delito de Opinião

Dez livros para comprar na Feira

Pedro Correia, 29.08.22

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Livro quatro: História de um Homem Comum, de George Orwell

Edição E-primatur, 2022

239 páginas

 

Este livro veio preencher uma lacuna no nosso mercado editorial: era o único dos seis romances de George Orwell (pseudónimo de Eric Blair, 1903-1950) ainda inexistente com chancela portuguesa. A iniciativa constitui serviço público. Até porque esta História de um Homem Comum (Coming Up For Air, no original) é hoje considerada uma das suas melhores obras.

Toda a ficção do autor de Homenagem à Catalunha é um acto de militância contra sistemas iníquos - seja na corajosa autópsia do colonialismo inglês no Oriente (Dias da Birmânia), seja na denúncia de uma sociedade rendida à tentação do dinheiro (O Vil Metal), seja no implacável libelo contra o comunismo (O Triunfo dos Porcos), seja na aterradora antevisão de um mundo mergulhado na tecnologia que dissolve toda a liberdade individual (1984). Convicto, como ele dizia, que «o totalitarismo, quando não combatido, poderá triunfar onde quer que seja».

Em História de um Homem Comum, escrito em 1938 e publicado em Junho do ano seguinte, Orwell prevê com argúcia a eclosão da guerra e o modo como este conflito à escala planetária mudaria a face do mundo. Mas esta não é uma obra de cariz político no sentido estrito do termo: o grande escritor britânico descreve aqui o percurso biográfico de um inglês banal, de meia-idade, cruzando-o com as quatro primeiras décadas do Reino Unido no século XX. Interessa-lhe mais a sociedade do que a ideologia. Sem se pôr de fora. Pelo contrário, faz questão de atribuir ao protagonista o seu próprio nome literário.

«George Bowling representa, na sua mediania, milhões de pessoas como ele, para quem a família e o emprego são o núcleo à volta do qual tudo gira e no qual tudo se esgota», escreve no prefácio a esta edição - felizmente imune à praga do "acordo ortográfico" - a professora universitária Jacinta Maria Matos, que fez bem ao evitar a tradução literal do título, tornando-o mais apelativo ao leitor português. 

Em tom de assumida nostalgia, esta História de um Homem Comum fala-nos de uma época que ficou para sempre ultrapassada com a dilacerante Grande Guerra de 1914-1918: «É como se um um diabo dentro de nós nos fizesse andar para trás e para diante, sempre ocupados com ninharias. Há tempo para tudo menos para o que interessa.»

Bowling, ecoando as inquietações de Orwell sobre o rumo do "progresso", tinha a certeza de que aquilo que viesse seria a antítese da sua doce infância remediada numa pacata vila inglesa que a voragem do tempo sepultou.

 

Sugestão 4 de 2016:

Páginas de Melancolia e Contentamento, de António Sousa Homem (Bertrand)

Sugestão 4 de 2017:

Os Filipes, de António Borges Coelho (Caminho)

Sugestão 4 de 2018:

Não Respire, de Pedro Rolo Duarte (Manuscrito)

Sugestão 4 de 2019:

Dois Países, um Sistema, de Rui Ramos e outros (D. Quixote)

Sugestão 4 de 2020:

Que Nós Estamos Aqui, de João Tordo (Fundação Francisco Manuel dos Santos)

Sugestão 4 de 2021:

Uma História da ETA, de Diogo Noivo (E-primatur)

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