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Delito de Opinião

Dez livros para comprar na Feira

Pedro Correia, 23.08.21

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Livro dois: Presos por um Fio, de Nuno Gonçalo Poças

Edição Casa das Letras, 2021

278 páginas

 

Este livro cumpre serviço público. Porque começou a investigar onde o jornalismo parou. Resgatando do esquecimento colectivo os crimes cometidos pelas chamadas Forças Populares 25 de Abril, fundadas e lideradas por Otelo Saraiva de Carvalho. Já com a democracia consolidada, houve em Portugal um movimento terrorista que, a pretexto da luta contra o «Estado burguês», assaltou, roubou, feriu e matou. Durante sete anos, de 1980 a 1987. Entre as vítimas mortais incluíram-se um bebé de quatro meses em São Manços, Évora. E o director dos Serviços Prisionais, assassinado com tiro na nuca, à porta de sua casa. E um jovem agente da Polícia Judiciária, que deixou viúva grávida.

As FP-25 sempre beneficiaram de uma insólita tolerância no plano mediático. Como se estes crimes que mancharam de sangue a democracia portuguesa merecessem atenuante por envolverem o comandante operacional da Revolução dos Cravos.

Nuno Gonçalo Poças, advogado nascido em 1985, não tem memória viva desses tempos. O que torna ainda mais meritório este livro, fruto de um trabalho de investigação sério e rigoroso. Mergulha nos arquivos da época, recolhe depoimentos de diversas testemunhas e procede à minuciosa autópsia do longo processo judicial que levou à condenação de mais de meia centena de réus, incluindo Otelo, num tribunal criado para o efeito e com protecção especial aos magistrados em risco de vida. Tudo culminou numa chocante amnistia cozinhada pelo poder político na década de 90. Dos 16 mortos, apenas um – soldado da GNR – tem nome de rua. Nenhum recebeu indemnização porque o Estado se esqueceu de ordenar o arresto de bens dos autores materiais e morais dos crimes. Nunca houve uma associação de apoio às vítimas. Enquanto a cúpula das FP-25 beneficiava da solidariedade aberta nos jornais e de abaixo-assinados pró-amnistia com assinaturas de muitos nomes conhecidos da cultura, da política e do espectáculo.

Dois pesos, duas medidas. E um prolongado manto de silêncio a que Nuno Gonçalo Poças acaba de pôr fim, combatendo a desmemória. Com nomes e datas. Para que todos saibamos.

 

Sugestão 2 de 2016:

Nada, de Carmen Laforet (Cavalo de Ferro)

Sugestão 2 de 2017:

Singularidades, de A. M. Pires Cabral (Cotovia)

Sugestão 2 de 2018:

Deuses de Barro, de Agustina Bessa-Luís (Relógio d' Água)

Sugestão 2 de 2019:

A Língua Resgatada, de Elias Canetti (Cavalo de Ferro)

Sugestão 2 de 2020:

Três Retratos - Salazar, Cunhal, Soares, de António Barreto (Relógio d'Água)

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