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Delito de Opinião

Dez livros para comprar na Feira

Pedro Correia, 21.08.21

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Livro um: No Devagar Depressa dos Tempos, de Marcello Duarte Mathias

Edição D. Quixote, 2019

542 páginas

 

Ao contrário do que sucede noutras latitudes, a prosa diarística ainda é rara em Portugal. Não por acaso, o Diário de Miguel Torga continua a ser a grande referência entre nós, resistindo a todas as modas. A excelente Conta Corrente, de Vergílio Ferreira, passou como cometa fulgurante na década de 80 e hoje só se encontra em alfarrabistas. Tem havido esparsas tentativas de reviver o género, revelando-se quase sempre esforço infrutífero – como os Cadernos de Lanzarote, de José Saramago, espécie de exercício narcísico que roça o insuportável em tantas páginas.

O mais digno herdeiro de Torga neste domínio – sem a verve cáustica de Vergílio – é Marcello Duarte Mathias, que cedo começou a cultivar o seu diário, com primeiro tomo publicado em 1980. Já com o título desta antologia: No Devagar Depressa dos Tempos, extraído de frase cunhada por João Guimarães Rosa. Sucederam-se outros sob a mesma epígrafe, marcados por países e cidades onde o autor ia lançando âncora, enquanto embaixador de carreira: Os Dias e os Anos, Diário da Índia, Diário de Paris, Diário da Abuxarda – o mais recente galardoado com o Grande Prémio de Literatura Biográfica da Associação Portuguesa de Escritores.

Este volume que reúne trechos escolhidos de todos os diários merece ser saboreado com vagar. Abrange mais de meio século, entre 1962 e 2014, reflectindo sobre acontecimentos que marcaram a história do mundo e as profundas transformações em Portugal. É obra tocada mas não contaminada pelo que ocorre no exterior. E sulcada de notáveis aforismos. Eis alguns: «Deus nasce e ausenta-se todos os dias; «A história do homem é a das suas nostalgias»; «Gasta-se uma vida inteira a corrigir um erro de trajectória.»

O que mais importa aqui é a peregrinação interior de quem escreve ao transpor anos decisivos de amadurecimento, envelhecimento e fatal confronto com transfigurações várias – começando pela morte de alguns que lhe estão próximos.

Revelações em tom discreto, envoltas em elipses, com pudor quase enigmático. Numa aura de serenidade a que só podemos chamar sabedoria.

 

Sugestão 1 de 2016:

O Islão e o Ocidente, de Jaime Nogueira Pinto (D.Quixote)

Sugestão 1 de 2017:

A Máquina do Tempo, de H. G. Wells (Antígona)

Sugestão 1 de 2018:

Delito de Opinião, de vários autores (Bookbuilders)

Sugestão 1 de 2019:

O Fundo da Gaveta, de Vasco Pulido Valente (D. Quixote)

Sugestão de 2020:

As Sílabas de Amália, de Manuel Alegre (D. Quixote)

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