DELITO há dez anos
José Navarro de Andrade: «Sempre que alguém se declara indignado (indignadíssimo, zangado, quase revoltado, etc…), de quem me lembro irremediavelmente é de Dona Maria I, a Louca. Ninguém mais do que ela se terá indignado e com justa razão. Enquanto pela Europa começavam a bruxulear as Luzes, em Lisboa Maria de Portugal não conseguia dormir, porque mal fechava as pálpebras via seu augusto pai lambido pelas labaredas do inferno, onde fora sem dúvida parar por conivência com as impiedades do Pombal, esse pé-de-cabra e cúmplice dos pedreiros. Como se não fosse punição que bastasse, durante o seu reinado Maria I padeceu o terramoto, soube da decapitação de Luís XVI de França pela turbamulta tricolor e morreram-lhe nos braços, em menos de um par de anos, seu marido (o apagadíssimo Pedro III, que além de real consorte era não menos real tio da Rainha), seu primogénito, José como o avô, sua filha e genro, todos levados pelas bexigas doidas.»