DELITO há dez anos
Gui Abreu de Lima: «Naquele último ano em Angola eu tinha feito uma exemplar 1.ª classe. Lia todos os reclames da cidade com destreza, contava dinheiro sem dúvidas e inaugurava-me nos caminhos da Liberdade. Vagueava pelas ruas, juntava-me a uns quantos como eu, e a praia Morena era toda nossa. Eu já estava lançada e a minha família habituada, quando vossemecê apareceu todo badalado. Foi vir e ver: só desgraça, só confusão. A bem dizer, tramaste-me a vida. E não foi pouco. Estava tudo muitíssimo bem encaminhado lá em Benguela. Tudo sobre rodas, 25! A minha Liberdade acabou quando a tua começou. Isso não gostei. Não gostei mesmo, ó 25.»
Laura Ramos: «À tarde não houve aulas. O almoço foi de família italiana. E depois saímos, competentemente tutelados pelos irmãos mais velhos, deambulando pela Praça em grupos cada vez maiores, para acabar em frente à PIDE, entre centenas e centenas de povo unido: uns a berrar, outros a rir, outros a chorar, outros a pensar. Entretanto, o liceu feminino perdera a virgindade. Entravam amigos a toda a hora. O Sérgio, o célebre Sérgio S. - nosso colega de ano, mas do liceu masculino, o 'D. João III' -, inflamava as hostes femininas, de giraço que era... Culto, civilizado, brilhante, inspirador. Falava magnificamente, como Che: em cima de um muro, no palco do ginásio, onde quer que fosse. Bonito, inteligente, ardente, luminoso (um cocktail fatal). Eram as primícias do MRPP, sem que soubéssemos.»