DELITO há dez anos

Cláudia Köver: «Lia eu feliz e contente os jornais pela manhã, quando tropeço nesta notícia e nesta frase específica, chegando logo para o lado o doce de morango e a chávena do café. Temos todos direito a concordar ou não com Merkel e com as medidas de resolução para a crise em que nos afogamos. Mas criticar o "atrevimento de uma senhora que vem da Alemanha do Leste e de um país que provocou duas guerras mundiais”, é uma associação muito má...»
João Carvalho: «Se fosse há ainda não muito tempo, teria de dizer-vos que estava a ler o "Manual de Acolhimento do Centro Hospitalar de Gaia", vejam só. Afastada esta que mais parece uma nota de humor negro, tenho de confessar que estou a ler (imaginem) Amantes dos Reis de Portugal, um livro de segredinhos e mexericos históricos de alcova que tive de interromper há já vários meses e em que repeguei agora.»
José António Abreu: «O empobrecimento colectivo português é inevitável. É-o, de resto, há muitos anos. O empobrecimento das pessoas que trabalham no sector público e das que trabalham no sector privado. Não é preciso a troika dizê-lo nem é preciso que o governo proceda a cortes «idênticos» em ambos os sectores para que tal se verifique. Tem de o fazer no público porque não há outra forma. É ele o patrão. No privado, os métodos são inúmeros e começaram a ser usados há muito. Vão agravar-se, claro. Desde logo, no comércio vão agravar-se tanto que muita gente vai ser despedida. Na indústria, dependerá das áreas de actividade e da capacidade exportadora.»
José Maria Gui Pimentel: «O mais recente boom no mercado chinês diz respeito à procura por um bem, aliás, serviço, aparentemente efémero, mas com um efeito no status social muito persistente: o casamento, claro está. As lojas de organização deste tipo de eventos brotam de todos os cantos, sendo invariavelmente as mais bem apresentadas das redondezas. Nestas, mais do que o serviço, vende-se o Sonho: desde a marcha nupcial à entrada dos noivos, ao bolo enorme, não descurando, evidentemente, exuberantes vestimentas, o fato para o noivo e o vestido para a noiva.»
Luís M. Jorge: «Algum dos senhores jornalistas me podia apresentar, antes de Dezembro, um trabalho de investigação decente intitulado "Como preparar-se para a extinção do Euro"? Muito agradecido.»
Luís Menezes Leitão: «Estas declarações de Cavaco Silva demonstram que ele é o verdadeiro líder da oposição em Portugal. Não falo de oposição ao governo, porque o governo limita-se a executar acriticamente os ditames da troika. Falo da oposição à própria troika, aquele conjunto de funcionários não eleitos e principescamente pagos que efectivamente nos governa. Desde o governo de Beresford no séc. XIX que Portugal não assiste a nada semelhante.»
Rui Rocha: «É fundamental termos presente que a crise está a ser gerida pela Senhora Merkel. A Senhora Merkel é uma política. Alguns (pouquíssimos) políticos são estadistas. Outros (ainda menos) têm coração. A nenhum falta uma agenda. A da Senhora Merkel só tem, por esta altura, uma data assinalada. A do dia em que irá a eleições. Por isso, importa perceber o que os alemães querem e o que não querem. E eles querem paz e prosperidade (ai os sacanas). Por isso mesmo, não querem o estouro do euro.»
Eu: «Alguns de nós podemos hoje orgulhar-nos de ter feito jornalismo numa época que mais tarde será recordada como tempo de pioneiros. Nós, os membros dessa vasta tribo do jornalismo pré-digital. Em que o acesso às fontes era mais difícil, a confirmação de factos não podia concretizar-se com um simples clique num rato, os modems e os telefones de satélite ainda tinham uma aura de ficção científica e o papel impresso parecia quase tão eterno como na geração de Guttenberg. Eram tempos agitados -- mas, paradoxalmente, mais calmos do que os de hoje, em que a tecnologia que devia facilitar-nos o quotidiano acaba por constituir uma nova espécie de escravatura. Tempos em que havia mais vagar para o convívio, para o ócio que estimula a criatividade, para a conversa de circunstância que permitia cimentar amizades que nunca acabam.»
