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Delito de Opinião

DELITO há dez anos

Pedro Correia, 25.01.20

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Ana Margarida Craveiro: «Lopes da Mota acordou um belo dia de manhã, e decidiu que não gostava da palavra Freeport. Primeiro, não é uma palavra portuguesa, e, depois, até é difícil de dizer, com aquele "t" pendurado no final. Assim, fez pressão sobre dois procuradores, para que a famigerada palavra desaparecesse do léxico processual. Não era por mais nada, a sua motivação era tão só a pureza da bela língua portuguesa. Teve algum sucesso, que esperamos ver confirmado no final do mês, com a conclusão do caso, e a erradicação da referida palavra do nosso quotidiano. A luta semântica vencerá.»

 

Ana Vidal: «Já ouvi mais do que um estilista português afirmar - com ar  ofendido, ainda por cima - que não existe anorexia na moda portuguesa. (...) Não existe anorexia??? Por favor! E, mesmo que não existisse "no interior" do mundo da moda (o que é falso), o que dizer do mundo "cá fora", a quem a moda se destina? Ou será que a influência daquelas figurinhas cadavéricas (que dão pelo nome de manequins) nos adolescentes, também é inexistente? É só ter a coragem de ir até ao Hospital de Santa Maria, por exemplo, e ver... com olhos de quem quer ver. Mais: não é apenas um problema feminino. Cada vez mais está a afectar os rapazes também.»

 

João Campos: «Saio ao cair da noite para um pouco de ar puro e para um whisky. No café, vejo a equipa portuguesa de futebol de salão ser metodicamente arrasada por Espanha. Ainda não podem vir de comboio-de-alta-velocidade até às calientes praias do Mar da Palha, os coitados dos espanhóis, por isso entretém-se a fazer-nos correr atrás de uma bola num campo sintético. Podia dar-lhes para pior, entenda-se.»

 

Teresa Ribeiro: «Nas esplanadas, nas paragens de autocarro, no metro, em todo o lado observo gente a falar ou a clicar no telemóvel. Numa época em que tanto se fala de solidão andamos conectados mais que nunca. É curiosa esta aparente contradição. Não fosse a tal fobia ficaria, talvez, um pouco confusa. Assim, pareceu-me lógico presumir que o medo de ficar sem telemóvel e a sua utilização massiva e compulsiva são a expressão do mesmo horror ao vazio.»

 

Eu: «É a pergunta, dramática mas inevitável, que fica a repercutir na mente de qualquer leitor que percorra estes parágrafos transbordantes de emoção. Haverá um amanhã para o Haiti? Haverá um amanhã para países forçados a enfrentar catástrofes naturais somadas à criminosa negligência dos homens? Haverá um amanhã para um jornalismo cada vez mais distante das parcelas do globo que só conseguem ser notícia quando são varridas pela tragédia?»