Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Delito de Opinião

Declaração de voto

José Meireles Graça, 11.01.21

(Continuação de ontem)

Resta Tiago Mayan. Sofre por não ser conhecido, ter o patrocínio de um partido que, por não ter massa crítica nem história, ainda se permite alguma rigidez ideológica, e por a sua inexperiência propiciar alguns faux-pas – muito menos, porém, do que seria de esperar. O resultado é uma incógnita: beneficiará, pelo menos, do eleitorado da IL, mas não é provável que, por puro desconhecimento (quem viu os debates, hem?), vá arrebanhar muitos mais.

E então, Marcelo é de direita, uma direita social, como ele diz? É sim senhor, na exacta medida em que isso o faça ser popular. Porque se para conservar a popularidade for necessário acentuar o social a ponto de se confundir com uma governação socialista (a governação socialista mais à esquerda que o país já teve, desde logo porque apoiada por comunistas), então Marcelo não hesitou.

Na retórica marcelista, a sua benevolência decorre da necessidade de estabilidade, do facto de o Presidente não dever ser uma força de bloqueio, e da legitimidade democrática do Governo, que foi eleito para governar, enquanto ele para presidir.

Tretas. A estabilidade é um meio para atingir um fim. E o fim não pode ser uma governação que engordou o Estado enquanto a dívida se manteve em níveis estratosféricos, com uma redução duvidosa e tímida, num pano de fundo em que o único crescimento foi o engendrado pelo turismo, um bodo que caiu do céu. Isto enquanto o BCE passou a ser acomodatício, sem nenhuma garantia de que o será indefinidamente, e com o país a deslizar consistentemente para os últimos lugares do desenvolvimento.

O Presidente pode e deve ser uma força de bloqueio, na medida dos limites constitucionais, e tem para isso legitimidade porque, ao contrário do Governo, recheado de anónimos, foi directamente eleito. E isto para não falar da famosa magistratura de influência, que Marcelo diz ter exercido nos bastidores. Devem ter sido abraços, selfies confidenciais, e pedidos, face a escândalos sucessivos: vejam lá se dão um jeitinho.

Para termos um Presidente que reina, talvez não fosse pior optar pela monarquia: ao menos o Rei tinha fardas de gala, entretínhamo-nos com as trincas e mincas da Família Real, ganhávamos uma visibilidade internacional que ajudava o turismo que há-de voltar, e ficava-nos mais barato.

O social da argumentação marcelista está lá para justificar a imensa máquina do Estado patrão, regulador, intervencionista, paternalista, e para lembrar aos distraídos que é social-democrata da variedade Rio – não da variedade Passos Coelho, que um dia lhe chamou, com razão, catavento.

Marcelo não é de direita, a menos que por isso se achasse que basta ser católico, não comunista (em vez de anti), titubear umas coisas equívocas em questões sociais e derramar há décadas em torno de si um imenso caudal de banalidades respeitadoras do ar do tempo, com a única marca distintiva – essa sim, genuína – de agradar.

Amanhã continua, se a paciência dos leitores não estiver já, tristemente, exaurida.

12 comentários

Comentar post