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Delito de Opinião

Custa sempre ser o último a saber

Augusto Santos Silva

Pedro Correia, 14.06.21

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Noutros tempos, o titular da pasta dos Negócios Estrangeiros era um dos homens mais bem informados do país. Este atributo vinha-lhe do exercício da própria função: a diplomacia só é bem-sucedida quando surge alicerçada em sólido conhecimento de pessoas e situações.

Como acontece com outras tradições, também esta se vem perdendo. Precisamente no mandato do actual inquilino do Palácio das Necessidades, um dos raros membros do Governo que seguramente leram Maquiavel. Dizia o sábio florentino que a boa informação é condimento indispensável para o governante prudente tomar decisões acertadas.

Augusto Ernesto dos Santos Silva, 64 anos, destaca-se no terceiro posto da hierarquia governativa, enquanto ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros. A condução da diplomacia parece assentar que nem uma luva a este catedrático que enverga gravata socialista depois de se aliviar da ganga da extrema-esquerda que usou na juventude. Antes de António Costa, serviu António Guterres (ministro da Educação e da Cultura) e José Sócrates (ministro dos Assuntos Parlamentares e da Defesa Nacional). Sempre com inegável zelo, indesmentível argúcia e algum brilho retórico.

Até por isto, causou estranheza vê-lo invocar surpresa ao ser confrontado com a decisão do Executivo britânico de retirar Portugal da via verde para voos turísticos após duas semanas de foguetório pátrio enquanto víamos desembarcar forasteiros oriundos da pérfida Albion. Nós, cidadãos comuns, ficámos surpreendidos. De um ministro servido por competentes serviços de informações e experimentados funcionários no terreno, esperava-se mais.

Também soube a pouco o meio inicialmente utilizado por Santos Silva para exprimir perplexidade em nome do Governo português: a rede social Twitter, outrora o instrumento de comunicação favorito de um tal Donald Trump.

«Tomámos nota da decisão britânica de retirar Portugal da ‘lista verde’ de viagens, uma decisão cuja lógica não se alcança. Portugal continua a realizar o seu plano de desconfinamento, prudente e gradual, com regras claras para a segurança dos que aqui residem ou nos visitam», tuitou o ministro nesta reacção minimal. Quase pedindo desculpa por alegar desapontamento.

Já esta semana, comparecendo numa entrevista à TVI em óbvia estratégia de contenção de danos, partilhou com os compatriotas a sua mágoa face a Londres: «Durante as três semanas em que Portugal esteve na lista verde nunca as autoridades britânicas nos fizeram sentir qualquer preocupação que tivessem.»

Como mais antigo aliado da Grã-Bretanha, servimos de barriga de aluguer para albergar a final da Liga dos Campeões disputada entre clubes ingleses. Fornecemos estádio e bebidas. Eles vieram sem máscaras, emborcaram hectolitros de cerveja – e uma semana depois retiram-nos dos destinos autorizados invocando o aumento de contágios cá na terra. Gente ingrata.

Por estes dias, o ministro exibe uma expressão tristonha. Percebe-se porquê. Custa sempre ser o último a saber.

 

Texto publicado no semanário Novo

6 comentários

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    Anónimo 14.06.2021

    Será que a vacina vale alguma coisa, ou fomos enganados e agora estamos a pagar todos. Os maus exemplos do futebol, deu nisto: Em Portugal poucos querem saber do covid. E são muitos os que queriam turistas Ingleses e jogos de futebol em Portugal pouco se importando com a população ordeira e trabalhadora. É mais fácil receber gorjetas inglesas e bazucas da Europa!!

    Não querendo destoar da maioria, até para não pôr em causa a democracia. Também estendo a mão: Viva aos Ingleses! Viva ao Santos Silva!

    PS (Lembro-me de um Pedro Correia a pedir turistas Ingleses para o Algarve e campanhas fervorosas de adeptos nos estádios). Bons tempos!

    José Lopes
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    Pedro Correia 14.06.2021

    Lembra-se de eu pedir turistas ingleses para o Algarve? Deve estar muito enganado.
    Adeptos nos estádios, sim. Mas portugueses em Portugal, não ingleses em Portugal enquanto os portugueses continuam impedidos de aceder aos estádios e restantes recintos desportivos. Ainda ontem se viu: o Sporting venceu o campeonato nacional de futsal derrotando o Benfica num pavilhão vazio.
    Que tristeza, esta duplicidade de critérios. Com chancela das autoridades oficiais portuguesas.
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    Anónimo 14.06.2021

    "Ainda ontem se viu: o Sporting venceu o campeonato nacional de futsal"

    A confissão do pecador: Mais umas festas familiares caseiras = a mais covid. O Sporting não pode fugir com o rabo a seringa das responsabilidades.
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    Pedro Correia 14.06.2021

    Benfica-Sporting, ontem, num pavilhão vazio.
    Sporting sagrou-se campeão nacional vencendo o Benfica em casa deste. Vazia.
    Porque a DGS não permite público nos recintos desportivos.
    Mesmo assim há quem ladre contra isto, achando "excessivo". Gostariam também, talvez, que além de não haver público não houvesse jogadores. Fazia-se um campeonato virtual. Ou ficava tudo fechado em casa a jogar playstation.

    Não admira que quase metade dos tugas já admita uma ditadura em Portugal. São sujeitos como este anónimo que pensam assim.
    Como bois de lavra: adoram ter a canga aos ombros.
  • Sem imagem de perfil

    balio 14.06.2021

    a DGS não permite público nos recintos desportivos

    A DGS não, o governo! A DGS não manda.

    E, de facto, segundo julgo saber, a partir de sexta feira passada já passou a ser permitido público nos recintos desportivos. Exceto em Lisboa e em mais 3 concelhos. Por determinação do governo, não da DGS.
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