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Delito de Opinião

«Cristiano podia ter metido naquele livre»

Pedro Correia, 07.07.21

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Nasceu uma nova estrela no comentário futebolístico em Portugal: chama-se Marcelo Rebelo de Sousa e parece ter jeito para mandar bitaites sobre bola. Mostrando assim estar em sintonia com a esmagadora maioria dos compatriotas.

Talvez saudoso dos tempos em que dominava os serões televisivos de domingo, o Presidente da República não resistiu a debitar opiniões sobre o Portugal-Bélgica que já se tornou desafio de má memória para todos nós. Conseguiu até pôr fora de jogo dois comentadores titulares: Marques Mendes, na SIC, e Paulo Portas, na TVI, abdicaram no passado dia 27 de comparecer nas suas tribunas televisivas dominicais. Não há como o futebol para destronar a política.

Se não podes vencê-lo, junta-te a ele. Assim terá pensado o inquilino de Belém, que trocou a cansativa deslocação a Sevilha por um jantarinho mesmo ao pé de casa, no seu bairro de Cascais. Foi aí que uma chusma de repórteres o encontrou, certamente não por casualidade. Gerou-se uma competição de microfones, por vezes mais emocionante do que o embate entre portugueses e belgas na Andaluzia.

Marcelo até parecia António Costa cruzado com o saudoso Zandinga: surgiu em registo de “optimista irritante”, falando no intervalo do jogo e emitindo vaticínios para o desfecho da partida. “A Bélgica domina 15 minutos, nós estamos melhor 20 minutos. O Cristiano podia ter metido naquele livre. Jogámos melhor do que a Bélgica, surpreendemos a Bélgica, mas depois a Bélgica, muito eficaz, em três tentativas de remate à baliza acerta uma. Apanha-nos em contrapé, avançados, num contra-ataque muito rápido. Era praticamente imparável, aquele remate. Acho que temos jogado primorosamente bem. Agora só falta entrar a bola, ter golo.”

O Presidente podia ter ficado por aí, mas quis ir mais longe: arriscou que Portugal daria a volta e venceria 2-1. Confidenciando que trouxera uma garrafa de espumante para a celebração. Faltou-lhe a prudência de João Pinto, antigo campeão europeu do FC Porto: o melhor é fazer prognósticos só no fim.

Mais valia não ter falado, resmungam agora os supersticiosos, inconformados com a vitória belga. Mas fica-lhe este consolo: no confronto com as anteriores declarações de Ferro Rodrigues, levou a melhor. O que pouco surpreende, dada a insistente tendência do presidente da Assembleia da República em propiciar títulos de jornais e telejornais pouco abonatórios para a dignidade institucional do cargo. A novela da sua controversa deslocação a Sevilha – anunciada em Budapeste, reiterada no hemiciclo parlamentar e afinal transformada numa prosaica ida ao Algarve – parecia uma rábula do Ricardo Araújo Pereira, talvez para compensar o súbito desaparecimento do programa deste humorista na SIC.

Em linguagem futebolística, dir-se-ia que Marcelo venceu Ferro por margem tangencial. É certo que o segundo protagonizou mais tentativas de remate, mas nenhuma se concretizou. E acabou derrotado com autogolo.

 

Texto publicado no semanário Novo

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