Convidado: FERNANDO LOPES
Eternamente jovem
O aumento da esperança de vida, o prolongamento da vida académica, a forma como envelhecemos mais tarde e de um modo mais suave, arrastam consigo um prolongamento da infância para idades bem para lá dos 30, num processo que me causa estranheza. Entre mestrados e doutoramentos, muito por consequência do desemprego, mas também porque um mestrado passou a ser «habilitação mínima» num universo de licenciaturas curtas, a constituição tardia de família passou a ser norma.
Hoje todos achamos que alguém que faleceu para lá dos 70 anos ainda era novo. Há trinta anos, sete décadas era uma idade vetusta. Somos pais pela primeira vez aos 40, jovens quadros promissores aos 45, aos 55 é-nos pedida a jovialidade de alguém 20 anos mais novo.
Bem na meia-idade, não sinto que seja velho, mas em muitas coisas o meu tempo já não é deste tempo. Esperam de mim um entusiasmo quase inocente, quando há muito o perdi, e uma visão distante, muitas vezes cínica, é o que me caracteriza. Noutros tempos, a capacidade de comunicar só era valorizada se existisse substância; hoje a forma exerce primado sobre o conteúdo. Importa mais parecê-lo que sê-lo.
Nós, cinquentões, estamos encalhados em terra de ninguém. Esperam que tenhamos a energia, a mundivisão da gente nova, enquanto nos consideram demasiado velhos para algum tipo de progressão, profissional ou outra; esperam que dancemos as coreografias em vigor mesmo que para elas não tenhamos paciência ou vocação; que tenhamos o aspecto dos 30, a maturidade dos 40 e a energia dos 20.
Sempre dancei conforme a minha música, não pela que me queriam impor.
Hoje em dia ser assim, assumir a idade, não brincar aos eternamente jovens, é aceitar um estatuto de pária. Assim seja.
Fernando Lopes
(blogue DIÁRIO DO PURGATÓRIO)


