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Delito de Opinião

Cobardia física e miopia moral

Pedro Correia, 07.10.23

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Salman Rushdie fotografado por Murdo Macleod

 

Como era óbvio, mais um ano transcorrido, Salman Rushdie não foi distinguido com o Prémio Nobel da Literatura. Nem o será. O Comité Nobel está infectado há muito tempo pelos vírus da cobardia física e da miopia moral. Se dois tradutores foram assassinados por terem ousado verter os Versículos Satânicos para outros idiomas, mais ameaçados ficariam os membros do aludido comité se prestassem justiça a um escritor que já merece o galardão desde 1981, quando publicou esse extraordinário romance que é Os Filhos da Meia-Noite

Como premiar um autor que caminha há décadas sob o fio da navalha, condenado à morte pelos inquisidores islâmicos e alvo de um miserável atentado em Agosto de 2022 que o deixou cego de um olho? Ninguém se atreverá a tanto. Sem desconsiderar Jon Fosse, o norueguês distinguido este ano, a sua reiterada omissão da lista de galardoados acaba por enobrecer o romancista britânico nascido em Bombaim -- «o sobrevivente», como acertadamente lhe chamou a revista Le Point.

Está muito bem acompanhado nesta vergonhosa omissão, integrando um longo cortejo dos melhores do século XX, de Joyce a Borges, de Ibsen a Kafka, de Tolstoi a Orwell, de Malraux a Virginia Woolf. Todos superaram o maior dos desafios: o decurso do tempo. «Se conseguir passar no teste de mais uma ou duas gerações, poderá perdurar», escreveu Rushdie, precisamente n'Os Filhos da Meia-Noite, a propósito de outro assunto. Os prémios passam, os júris eclipsam-se, a obra fica.

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