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Delito de Opinião

Censura em directo

Pedro Correia, 22.11.20

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«Na noite das eleições presidenciais, as três televisões com mais audiência nos Estados Unidos (CBS, ABC, NBC) cortaram em directo o discurso do Presidente Trump, invocando que ele faltava à verdade. Nunca visto. Três semanas mais tarde contam-se pelos dedos da mão as análises e os comentários da imprensa europeia sobre este singular procedimento, assim reduzido a banal acontecimento. Nunca visto, também.

Uma primeira conclusão é possível tirar, já: a do grande embaraço - direi mal-estar - que a decisão dessas televisões provocou no universo dos media do Velho Continente. Não se aprova, nem se condena. Ora o silêncio nunca é uma tomada de posição, nesta matéria. É apenas uma omissão, envergonhada, acho eu. É claro que o corte no discurso foi noticiado. Mas não foi comentado. Ora cortar em directo um discurso, por muito desonesto e miserável que ele seja, do Presidente dos EUA, não é um problema das televisões, é um problema da liberdade de expressão. Quer se goste ou não de Trump, o Presidente legitimamente eleito tinha o direito de falar e os cidadãos a quem ele se dirigia tinham o direito de o ouvir - a menos que os considerem inimputáveis.

Porquê, então, este silêncio, que cheira a envergonhado? Em parte porque a quase totalidade da Imprensa europeia "votou" contra Trump, ainda antes de os americanos terem votado. E, em parte também, pela injustificada deferência com que os europeus olham para as televisões dos EUA.

(...)

Temos, portanto, que as televisões se arrogaram no direito de decidir no lugar dos eleitores entre o bom e o mau, o Bem e o Mal. Fizeram-no ao contrário da CNN (próxima dos democratas), da Fox (próxima dos republicanos) e da PBS (pública), que passaram o discurso na íntegra, contraditando-o nos oráculos, e depois comentaram que o Presidente tinha faltado à verdade ou produzira afirmações sem fundamento.

Colocam-se, pois, algumas questões para as quais será bom encontrar uma resposta a curto prazo. A partir de que momento o responsável de uma televisão tem legitimidade para silenciar um Presidente? Pode um jornalista interferir na transmissão em directo de acontecimentos com manifesto interesse público? E, na afirmativa, não estará esse mesmo jornalista, em vez de proceder como um observador isento da acção política, a actuar como um agente político que faz prevalecer a sua opinião sobre um acontecimento que, ademais, não comunicou à opinião pública?

Resta saber aonde conduzirá este precedente, não só nos EUA mas também nas outras democracias, de cada vez que as televisões julgarem, a partir de agora, que têm o direito de calar um Presidente eleito, porque, na opinião delas, ele está a faltar à verdade.»

 

Reflexões de José Manuel Barata-Feyo, novo Provedor do Leitor do Público, em texto ontem publicado neste jornal. Um longo texto que subscrevo da primeira à última linha.

8 comentários

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    Pedro Correia 22.11.2020

    A última coisa que quero é interpretar isto à luz da clubite ideológica ou partidária.
    Para esse peditório não dou.
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    Jorge Pacheco de Oliveira 22.11.2020

    Recebi um alerta no meu e-mail de que o Pedro Correia me tinha respondido.
    Clubite ideológica ou partidária...!? Ok, fiz mal em colocar aqui um comentário, pelo que não voltarei a fazê-lo.
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    Pedro Correia 22.11.2020

    Não imagina o abalo que me provocou.
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    Jorge Pacheco de Oliveira 23.11.2020

    Você julga-se com piada, caro Pedro Correia. Melhor faria em cuidar da sua memória, sobretudo para nomes. Não vale a pena continuar a comentar os meus comentários, pois vou retirar o link deste blog da minha lista de visitas e não o maço mais.
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    Pedro Correia 23.11.2020

    Lamento muito que o faça, meu caro. O que só tem como vantagem fornecer-me o pretexto de recordar como apreciei as suas teses saborosamente heterodoxas sobre alterações climáticas e o propalado "aquecimento global" - na linha do livro que tão bem traduziu com o saudoso engenheiro Rui Moura - na ocasião em que tive o gosto de conhecê-lo pessoalmente.

    Concluo que nem sempre os exercícios de ironia nos saem a preceito nesta era de diálogos digitais, em confinamento sem prazo, com sucessivos "estados de emergência" a ensombrarem o que nos vai restando de bom humor. Sucede-me também ao responder de rajada a dezenas de comentários que com frequência aqui se acumulam, muitas vezes sem reparar nos nomes - reais ou virtuais - de quem assina.
    O seu é bem real. E merece crédito e consideração, sem favor algum.
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    Anónimo 23.11.2020

    Caro Pedro Correia, não ligue, o Pedro não disse nada de mal ou que ofendesse assim tanto.
    Passe a frente!!!
    A falta de sentido de humor é sempre sinal de parco entendimento.
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    Pedro Correia 23.11.2020

    Pois é.
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