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Delito de Opinião

Catalunha: matéria de facto

Pedro Correia, 28.09.17

 

«La convocatoria del referéndum en Catalunya no es transparente porque está creada con una ley elaborada por el Parlament pero a espaldas de los demás miembros del Parlament.»

Joan Manuel Serrat 

 

 

1. O anunciado plebiscito sobre a soberania na Catalunha é ilegal. Porque os órgãos políticos catalães não têm legitimidade para convocá-lo. E porque, segundo o ordenamento jurídico espanhol, as questões de soberania não estão sujeitas a escrutínio referendário.

2.. Em democracia, num Estado de Direito, as leis devem ser cumpridas - não violadas. Por maioria de razão quando se trata da Constituição, a lei das leis. Não custa, portanto, acompanhar o catalão Josep Borrell, ex-presidente do Parlamento Europeu, quando assegura que a convocatória do pseudo-referendo na Catalunha pode ser equiparada a um "golpe de Estado".


3. A decisão de ilegalizar o "referendo" na Catalunha é do poder judicial, não do poder político. O Governo espanhol, como lhe competia, limitou-se a levar o assunto ao Tribunal Constitucional e a dar execução à decisão que dele emanou, ordenando a imediata suspensão cautelar da iniciativa ilegal dos órgãos políticos catalães. A aplicação prática destas medidas está sob jurisdição de um juiz de instrução de Barcelona.


4. Na óptica do TC, a suspensão cautelar justifica-se porque a iniciativa referendária viola a Constituição espanhola e o próprio Estatuto da Catalunha. Ilegalidade máxima, portanto. Nada que nos deva surpreender: nenhuma Constituição de um país europeu prevê a alienação de parcelas do respectivo território. Foi aliás esse o fundamento que levou há nove meses o Tribunal Constitucional da Alemanha a chumbar uma iniciativa referendária com vista à independência da Baviera.

5. A Constituição espanhola alude ao carácter "indivisível" do território espanhol e concede a soberania ao povo. Tal como a portuguesa, aliás. Por isso um suposto referendo para a declaração de independência da Madeira ou dos Açores, invocado por um hipotético movimento separatista regional, seria igualmente ilegal em Portugal.

6. O Governo autonómico de Barcelona pôs as instituições catalãs fora do Estado de Direito. De nada lhe serviu: não obteve qualquer apoio da comunidade internacional, a começar pela vizinha França. É ponto assente: só haverá referendo separatista na Catalunha com alteração prévia da Constituição. Para isso, os independentistas terão de dialogar com as instituições políticas em Madrid, não declarar-lhes guerra.


7. Tudo pode ser sujeito a debate, mas há matérias inegociáveis. Em questões de soberania, nunca o direito de voto será negado ao conjunto dos espanhóis, circunscrevendo-o aos residentes na Catalunha. O povo espanhol - que aprovou a Constituição por referendo, a 6 de Dezembro de 1978 - será sempre chamado a pronunciar-se nas urnas em matéria de soberania, através dos mecanismos da democracia representativa ou do voto referendário. Porque só ele é o soberano, como estipula o artigo 1.º, n.º 2, da Constituição.

 

8. Convém recordar que a Catalunha foi precisamente a região de Espanha que aprovou por mais elevada percentagem o texto constitucional no referendo de 1978: houve 90,46% de votos favoráveis e apenas 4,26% de votos negativos. Com uma participação de 67,91% dos eleitores inscritos nesses cadernos eleitorais.

 

9. Aqueles que hoje exigem a "consulta" independentista aos catalães que vivem na Catalunha são os mesmos que negam essa mesma consulta aos catalães que vivem em Castela, na Galiza, nas Astúrias, na Andaluzia, em Aragão, em Navarra, na Extremadura, em Leão, nas Canárias, na Comunidade Valenciana, nas Baleares e no País Basco. Absurdo supremo: um marroquino, um português ou um castelhano que morem em Barcelona poderiam "decidir" sobre o destino da Catalunha, mas um catalão residente em Madrid, Valência ou Sevilha seria excluído desta decisão.

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