Cadernos de um enviado especial ao purgatório (43)
O caso Tecnoforma visa destruir o principal capital político de Passos Coelho, a sua imagem de honestidade. Embora o primeiro-ministro tenha esclarecido as questões ligadas à denúncia anónima e as dúvidas sobre a exclusividade parlamentar, há quem ainda não esteja satisfeito. A denúncia era falsa e o processo foi arquivado. Sem novas informações, esta história está morta. O primeiro-ministro demonstrou de forma convincente que cumpriu as regras da exclusividade parlamentar a que se obrigou quando recebeu um subsídio. Passos Coelho é aliás um político pouco habitual, sem sinais exteriores de riqueza e que tem resistido aos interesses que dominam o regime democrático.
Ontem, enquanto ouvia o debate parlamentar, lembrei-me de uma história pessoal: estive na Guiné-Bissau em 1998, como repórter, e gastei muito dinheiro numa guerra onde não se passavam facturas. Na altura, não podia provar despesas de centenas de contos. Sou uma pessoa remediada, não tenho sinais exteriores de riqueza e o meu pai ensinou-me a não ficar sequer com um tostão que não seja meu. O jornal devolveu-me o dinheiro e não posso esquecer o chefe de redacção e o director que nem hesitaram em aceitar a minha palavra.
As pessoas honestas não podem ser confrontadas com situações onde tenham de provar a sua honestidade. O princípio aplica-se no caso Tecnoforma, onde foram esclarecidas as suspeitas que até agora surgiram. É por isso grave que o primeiro-ministro não tenha direito à presunção de inocência. É dramática a exigência de que prove a sua honestidade através da devassa pública e da abdicação de um direito individual. Se triunfar a demagogia, não haverá pessoas de qualidade na política. E sem pessoas de qualidade na política, o que teremos é a promiscuidade com os negócios, exactamente aquilo que toda esta retórica afirma combater.