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Delito de Opinião

Borgen

Luís Naves, 17.01.15

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A série dinamarquesa Borgen faz uma das melhores abordagens sobre a política que já vi em ficção. Os actores são óptimos, a escrita é perfeita, o ritmo, a música, enfim, todos os aspectos técnicos funcionam. Ao contrário do que sucede em séries americanas que abordam política ou jornalismo, aqui não há situações exageradas nem maniqueísmo nas personagens. O que mais atrai em Borgen é a forma exacta como ali se expõe a realidade da democracia parlamentar, nomeadamente a necessidade de negociar, o carácter inesperado das crises, a inevitabilidade das concessões, o poder dos interesses especiais, a linha fina que separa lealdade e traição, a escassez do tempo, a não repetição das oportunidades ou ainda a crueldade de certas decisões, como deixar cair alguém de quem se gosta, enfim, o carácter solitário da política que, paradoxalmente, não pode ser praticada sem convencer muita gente através da palavra.

A dramatização e a criação de um fluxo narrativo obrigam por vezes a situações onde se desafia a suspensão da descrença, mas genericamente os autores conseguiram esboçar personagens semelhantes a jornalistas e políticos reais. A história mostra correctamente a existência de um triângulo entre três vectores inseparáveis: a política, o jornalismo e a comunicação (ou spin). Nenhum deles vive sem os outros. O spin doctor não é alguém que esconda os factos, mas um gestor de crises, com importância na explicação das decisões (veja-se por exemplo o carácter central da escrita dos discursos). Os jornalistas nem sempre procuram a verdade, muitas vezes têm motivos egoístas ou seguem pistas falsas. Os políticos, tratados pelos autores sem demagogia, vivem no medo de perder tudo por causa de uma trivialidade e nem sempre fazem o que gostariam de fazer. Borgen mostra a força das democracias parlamentares europeias e é uma crítica demolidora às simplificações populistas.

Na primeira série, Birgitte Nyborg, vítma das circunstâncias, tornou-se uma primeira-ministra mais pragmática e insensível; a personagem de maior complexidade, Kasper Jull, ganhou em cinismo e manipulação; Katrine Fonsmark tornou-se menos idealista, vítima dos seus momentos de ingenuidade.

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