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Delito de Opinião

Baixando o nível

José António Abreu, 26.01.15

Nos tempos modernos, a Grécia nunca foi rica. Portugal também não e mesmo Espanha e Itália nunca conseguiram os níveis médios de rendimento e bem-estar de países como a Alemanha, a Áustria ou a Holanda. Os países do Sul (como, de resto, os seus 'discípulos' da América Latina) nunca perceberam as vantagens de manter contas públicas equilibradas. O exemplo português é elucidativo. Nos últimos séculos, os dois únicos períodos prolongados de crescimento deveram-se à acção de dois déspotas com preocupações de equilíbrio orçamental: o Marquês de Pombal e António de Oliveira Salazar. (O rendimento médio em Portugal era de cerca de 30% do rendimento médio europeu quando Salazar chegou ao poder e, apesar das medidas iniciais de austeridade, da guerra colonial e da filosofia de favorecimento de meia dúzia de grupos económicos, subira para mais de 50% no final do regime.) No Sul, a solução para os problemas passou invariavelmente pela desvalorização da moeda e subsequente inflação. Tome-se como exemplo o ano de 1981 (escolhido por ser o primeiro disponível para todos estes países nos Outlooks do FMI). A inflação nos sete países referidos foi de 21,2% (Portugal), 24,4 % (Grécia), 14,5% (Espanha), 19,5% (Itália), 6,3% (Alemanha), 6,8% (Áustria e Holanda). A separação de águas é demasiado notória para ser irrelevante (neste link podem ser comparados outros anos; a tendência mantém-se).

O euro fez com que, num primeiro momento, todos ganhassem: os países do Norte ficaram ainda mais competitivos e os países do Sul acederam a taxas de juro bastante mais favoráveis do que as suas economias recomendavam. Isto levou-os primeiro a níveis insensatos de investimento improdutivo e de endividamento e, depois, à inevitabilidade de corrigir abruptamente a trajectória (a austeridade é um efeito, não uma causa). Discute-se agora se é desejável atenuar – na verdade, eliminar – essa trajectória, perdoando dívidas e acabando com a austeridade. Para que tal suceda, será necessário assumir uma política em tudo contrária àquela que permitiu o enriquecimento dos países do Centro e Norte da Europa e em quase tudo idêntica à que nunca permitiu o enriquecimento dos países do Sul: aceitar os desequilíbrios em vez de os corrigir, emitir moeda, transferir fundos do Norte para o Sul (assumindo que é constitucionalmente possível). E o pior é que, permanecendo os países do Sul reticentes à aplicação de reformas que os possam tornar mais competitivos, nada permite considerar esta situação como temporária. Ou seja: quando o Syriza promete o fim da austeridade e o reforço das políticas públicas, está a fazê-lo às custas dos contribuintes alemães e holandeses e austríacos (e também portugueses e espanhóis e italianos mas estes têm razões para acreditar poderem sair beneficiados do processo) e nem sequer lhes permite a esperança de que dentro de poucos anos a economia grega consiga auto-sustentar-se. No fundo, a Grécia admite oficialmente desejar ser uma espécie de desempregado da Europa, recebendo o correspondente – e, tudo o indica, eterno – subsídio. Obviamente, caso tenha sucesso, outros lhe seguirão o exemplo.

De um inconsciente António Costa a uma bem consciente Marine Le Pen, muita gente ficou satisfeita com a vitória do Syriza. A curto prazo, ceder ao essencial das exigências de Tsipras e seus correligionários poderá permitir a sensação de que tudo melhora. A longo prazo, é um suicídio para a Europa.

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