Assim não consegue

Certos candidatos a cargos políticos abusam da informalidade. Eis um exemplo. A Catarina Martins conhece-me assim tão bem ao ponto de me tratar por tu nos cartazes com o seu rosto espalhados pela cidade de Lisboa?
Por acaso ela até me conhece: entrevistei-a em tempos para o Diário de Notícias, em anos recentes cruzámo-nos com frequência nos corredores parlamentares e viajámos duas ou três vezes na carreira 727 da Carris (lembro-me dela de máscara sanitária em tempos pandémicos). Mas nunca fomos próximos apesar de eu ter alguns amigos no Bloco de Esquerda.
Olho o cartaz e questiono-me qual será o grau de eficácia desta falsa intimidade com o eleitor.
Tenho sérias dúvidas de que resulte, a avaliar pela hecatombe eleitoral do partido que já teve 19 deputados e hoje só ocupa um lugar na segunda fila do hemiciclo. O mesmo partido que perdeu 75% dos seus vereadores nestas autárquicas, passando de quatro a nível nacional para um solitário assento na câmara de Lisboa, aliás à boleia do PS.
Havia elegido 94 deputados municipais, desta vez só conseguiu 17 - e apenas seis em listas próprias.
Perdeu agora mais de cem mil votos, baixando de 137.560 para 30.629.
Conclusão óbvia: o eleitorado quer distância do Bloco. Nada a ver com o tratamento por tu. Os gurus da propaganda do partido mais esquerdista do parlamento andam equivocados: aquela letra T ganharia muito em ser trocada por um S. Assim a comunicação política talvez funcionasse, com um distanciamento respeitoso. Porque não somos todos lá de casa. Aliás, neste momento quase ninguém é.
"Consigo" teria vantagem suplementar: a óbvia analogia com a primeira pessoa do presente do indicativo do verbo conseguir. Duplo significado, portanto. Como expressão de uma vontade firme. Andaram mal, os estrategos do BE: assim estragam mais do que remendam. E garanto: não é por me tratarem por tu que me aproximam mais deles.
Como dizia o poeta, sei que não vou por aí.

