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Delito de Opinião

Ambiente de trabalho VII

Teresa Ribeiro, 29.07.21

As novas elites não dão ponto sem nó. Traçam o seu percurso, começando cedo a identificar que pessoas devem conhecer e em que circunstâncias. Preparam-se cuidando dos mais ínfimos detalhes, porque hoje o  que parece, é. Há soft skills que devem constar num currículo, porque são muito valorizadas nos tempos que correm, daí ser conveniente exercer atividades a partir das quais se possa tirar ilações sobre a qualidade do seu carácter ou capacidade de trabalho. 

Como bailarinas em pontas aprendem, depois, a andar em bicos de pés para serem notados por quem tem poder. E o que é, para esta nova geração, ter poder? Ter poder é ter influência. Ser conhecido e reconhecido. Mas este reconhecimento não tem necessariamente a ver com competência, conhecimento e muito menos experiência. Três atributos que a nova cultura do trabalho esvaziou ao introduzir no discurso um novo mantra: proactividade, competitividade e "gosto pelo desafio". Três magníficos eufemismos cuja elasticidade permite cobrir um vasto leque de perfis, desde os jovens com ambição que desejam legitimamente subir na vida, àqueles que antes se designavam por arrivistas: tractores que não olham a meios para "chegar lá". Não importa como, pois já ninguém quer saber.

"Estar lá" quer dizer que se ganhou a medalha olímpica da notoriedade, o novo oiro. Não por acaso chegou-se ao ponto de criar uma nova "profissão", a dos influencers. Ter poder é conhecer e ser conhecido por "toda a gente", sendo que "toda a gente" é a gente que tem uma importante rede de contactos. Trata-se de uma pescadinha de rabo na boca, círculo onde até se vende a mãe para entrar, pois os que ficam de fora são nada. Pertencem à massa indistinta dos que não "chegaram lá". Engenheiros, arquitectos, artistas, limpa chaminés, jornalistas, rapariguinhas do shopping, é indiferente. A todos é dispensado um tratamento indiferenciado que se verte, de resto, em salários absurdamente semelhantes.

As novas elites lideram, sem complexos, áreas que desconhecem, apoiadas na expertise dos profissionais que este novo sistema proletarizou. Mas formadas que foram na cultura narcísica do autoelogio e do elogio mútuo sustentada pelas redes, não resistem a deixar a sua marca de génio na gestão de pessoas e coisas, tomando por capricho decisões absurdas e irresponsáveis, ignorando os conselhos de quem sabe, só pelo prazer de mandar. É nisto que estamos, nas mais diversas áreas de actividade. Até dói.

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