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Delito de Opinião

Adriano Moreira: cem anos

Pedro Correia, 06.09.22

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 Retrato de Adriano Moreira na galeria dos antigos presidentes da Sociedade de Geografia de Lisboa

 

A 10 de Julho de 2015, um senhor vestido formalmente, de cabelos brancos e testa alta, ergueu-se da cadeira onde estava sentado, numa livraria do centro de Lisboa, e durante três quartos de hora prendeu a atenção de algumas dezenas de pessoas que o escutavam com uma notável lição de história, geografia, geopolítica - tudo a pretexto da literatura.

Eu estava entre os que tiveram o privilégio de o escutar nesse fim de tarde. E admirei a impressionante rapidez de raciocínio, a notável fluência verbal e a claridade de ideias deste homem então com 93 anos. 

A expressão francesa sagesse aplica-se por inteiro a Adriano Moreira, que nessa tarde em Lisboa discorreu sobre a «comunidade de afectos» que a CPLP é acima de tudo - e como a língua comum funciona como poderoso traço de união entre os Estados-membros. Ao contrário do que sucedeu com outras antigas potências coloniais europeias, como a Bélgica ou a Holanda, incapazes de gerar laços afectivos com os povos residentes nas paragens que tutelaram.

 

Adriano Moreira foi subsecretário de Estado da Administração Ultramarina (1958-61) e depois ministro do Ultramar (1961-62) com António de Oliveira Salazar, de quem chegou a ser apontado como um dos seus mais jovens e promissores delfins. Enquanto ministro, aboliu a lei do indigenato - uma das medidas de maior alcance social alguma vez decretadas nos então territórios ultramarinos.

A corte da ditadura fervilhava de intrigas contra aquele jovem governante com 40 anos recém-cumpridos que se atrevia a revelar protagonismo num regime em que tantos progrediam na penumbra.

Um dia, em Dezembro de 1962, Salazar chamou-o e foi sucinto: «Nós acabamos de mudar de política.» Adriano Moreira foi igualmente sucinto: «Então acaba de mudar de ministro.»

 

Nunca mais reassumiu um posto governativo. Correu mundo, escreveu livros, (Tempo de Vésperas, O Novíssimo Príncipe), radicou-se no Brasil após o 25 de Abril, regressou a Portugal, foi eleito deputado e presidente do CDS, mais recentemente destacou-se como conselheiro de Estado. Tendo exercido a advocacia, nunca escondeu qual era a sua paixão de sempre: o ensino. Deu aulas durante dezenas de anos e deixou um rasto de admiradores em todos os continentes: é um dos portugueses com maior vocação universalista.

«A minha mãe ensinou-me que Deus é companheiro e nunca me esqueci disso. Nunca ando sozinho, nunca ando sozinho», declarou este católico convicto em Maio de 2015, numa longa entrevista ao jornal i.

Pensa bem e diz o que pensa. Gostem ou não do que ele diz. Se em Portugal existisse Senado, ele seria o nosso primeiro senador. Festeja hoje um século de nascimento, continuando a ser um sonhador. Ouvi-lo falar com tão espantosa agilidade mental, como tive o privilégio de o escutar há sete anos, foi para mim também uma lição de vida. 

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