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Delito de Opinião

Adolescência

José Meireles Graça, 26.03.25

Nas redes que frequento e onde frequentemente ilumino a turba com opiniões percucientes havia há dias um ror de textos sobre a série Adolescência (na Netflix). Não é raro e já tenho enfiado por mor destas leituras alguns barretes.

Desta vez, porém, não apenas se gabava a qualidade da realização e representação – isso era pacífico – mas as opiniões divergiam sobre a natureza do problema que a série (4 episódios) relata, e mais ainda sobre as soluções.

É lá, se não há acordo talvez valha a pena ver. Vale. Trata-se de um miúdo de 13 anos acusado de ter assassinado à facada uma aluna da mesma escola, o que fez a polícia para deslindar a meada, como reagiram os pais e a irmã, como funcionava a escola e o que move, e como se move, a canalhada hoje em dia.

A realização é excelente, conseguindo o prodígio de, sem pressas (às vezes parece o tempo real), prender o espectador, e o desempenho, incluindo dos adolescentes, sobretudo o herói, notável. Eu vi a série de cambulhada (fui-me deitar a desoras), aprende-se muito sobre como funciona a polícia inglesa em casos destes, o que é uma escola multi-rácica que é provavelmente típica, o que é uma análise psicológica bem feita por uma profissional que intervém magistralmente com um interrogatório, o papel que têm as redes sociais (no caso a estrela era o Instagram) no modo como os miúdos se relacionam uns com os outros, e a ignorância e a cegueira em que vivem os pais.

Das soluções que vi apresentar discordo: não é exigível aos pais que tenham uma vida profissional diferente e mais disponível, a culpabilização deles é uma crueldade acessória dispensável, assim como se exagera nas sugestões adiantadas para anular o risco da ausência de supervisão das interacções dos miúdos, incluindo o bullying, e se vilificam as redes com alguma ligeireza.

Mas a indisciplina na escola, a omnipresença dos telemóveis, a tribalização levada ao extremo, os códigos de conduta desenvolvidos na mais completa ignorância de pais e educadores – tudo recomenda que se olhe para o assunto e se encontrem meios de restaurar um módico de civilização. A escola ensina e também forma, não no sentido de substituir os pais mas sim na imposição de regras que sejam as necessárias para uma vida colectiva sã.

Não só isto, claro. Mas, deixando-me ir, acabaria por revelar a trama, maldade que não vou fazer porque quem vai ver que sofra como eu sofri em metade da fita.

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