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Delito de Opinião

Abuso da autoridade e redução de direitos

14 estados de emergência em 13 meses

Pedro Correia, 01.04.21

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Entramos hoje no 14.º estado de emergência imposto nos últimos 13 meses - com drástica restrição de vários direitos constitucionais e o prolongamento do "dever geral de recolhimento" que nos força a reclusão domiciliária, excepto para trabalhar. Este Presidente da República, este Parlamento, este Governo encaram o cidadão português como mero homo faber - excepto os desempregados, cuja cifra real já ultrapassa meio milhão

Neste quadro, o homo ludens é severamente reprimido. Excepto se for estrangeiro ou não residente habitual em território português: para esses não há dever de recolhimento. Pelo contrário, têm direito à livre circulação em território nacional, como admitiu a secretária de Estado do Turismo, sem sequer reparar que lesava outro princípio básico do nosso texto constitucional: o direito à igualdade.

Autoriza-se liberalmente a uns o que se nega severamente a outros. Que o diga o cidadão de Torres Novas multado pela PSP por estar a comer uma sanduíche no interior do seu automóvel: este "gesto transgressor" custou-lhe 200 euros. Que o diga o jovem da Lousã multado pela GNR por ter comprado gomas numa máquina de venda automática: esta "violação da lei" levou o guarda, em manifesto excesso de zelo, a a privá-lo também de 200 euros. O doce ficou-lhe amargo.

 

Notórios abusos da autoridade, que noutros tempos suscitariam severas críticas públicas. Hoje, porém, a opinião colectiva parece anestesiada. São incontáveis as pessoas que até justificam e aplaudem estes abusos enquanto espiam colegas e vizinhos, assegurando que usam máscara em qualquer circunstância na via pública (algo que nenhuma lei prevê), saem excessivamente à rua (como se fosse crime de lesa-Estado) e mantêm "distâncias de segurança" (que alguns imaginam ser no mínimo de dez metros). 

Tudo num quadro de saúde mental que se deteriora a olhos vistos. Só não vê quem não quer. Gostaria que os nossos telediários debitassem menos estatísticas oficiais sobre a pandemia e dedicassem mais espaço ao alarmante incremento das situações de ansiedade, depressão e pulsões suicidas na população portuguesa - tema que está muito longe de merecer a atenção que merece, tanto das entidades oficiais como dos órgãos de informação. 

O desemprego, a cascata de dívidas, as falências em série, a brutal quebra de rendimentos, a solidão forçada, as expectativas traídas, a ausência de perspectivas de futuro - tudo isto potencia um quadro de empobrecimento geral, também na dimensão psicológica. Num país onde comprar gomas ou mastigar um bocado de pão se tornaram actos ilícitos.

Não alimentem ilusões: só pode acabar mal.

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