A montanha-russa
Instaurar queixa-crime contra o Presidente da República por suposta «traição à pátria», como ontem André Ventura anunciou com base em putativos pareceres jurídicos de pai e mãe incógnitos, é ideia a tal ponto demencial que terá suscitado estupefacção até entre deputados do Chega.
Ventura está na política em loop contínuo: entra em ansiedade se permanecer um par de horas sem surgir na televisão. Ontem partilhou as prioridades noticiosas com José Castelo Branco - outro astro das pantalhas, agora suspeito de violência doméstica. Isto permite-lhe desviar atenções dos temas europeus, cada vez mais incómodos para o seu partido - que se prepara para integrar uma família política na Eurocâmara (o Grupo Identidade e Democracia, da ultra-direita) onde abundam os apoiantes de Putin. E ocultar as posições pró-Moscovo do candidato que escolheu para encabeçar a sua lista às eleições de 9 de Junho.
Mas tamanho frenesim não se explica apenas por estas considerações de mero cálculo político. O líder do Chega foi-se viciando em descargas de adrenalina próprias de quem se embriaga com as alucinantes reviravoltas da montanha-russa. Acabará por ser vítima delas: outros o forçarão a experimentar o seu próprio veneno populista, em dose redobrada. Mais cedo do que tarde, como se verá.