A liberdade e os outros
Sofia foi este fim de semana a um casamento onde estiveram 200 convidados. Eu não conheço a Sofia, mas por causa dela durante 14 dias vou evitar algumas pessoas e reforçar os cuidados no convívio com aqueles que tenho de contactar diariamente. Custa-me condicionar assim a minha vida, mas não quero ser um risco para ninguém. Mal sabe a Sofia, que nunca vi, mas que está todos os dias em contacto com a minha filha - que vive comigo - o trabalho e preocupação que o seu programa de fim de semana me está a dar. Podia agir como se nada fosse? Podia. Mas dei cálculo de probabilidades na escola e uma festa para 200 pessoas, onde se come e se dança durante horas, é um risco. Se apanhar o bicho através da minha filha, ao menos sei que fiz o possível para o não transmitir a ninguém.
Haverá quem considere isto excesso de zelo, ou até mesmo histeria. A questão é que não tenho bola de cristal. As estatísticas que alguns gostam de brandir, revelam que o novo coronavírus faz poucas baixas e afecta seriamente pouca gente, mas nunca poderei saber, em antecipação, se todas as pessoas que pertencem ao meu inner circle vão reagir bem a uma investida do bicho. Daí as minhas cautelas e caldos de galinha. Daí ter também dificuldade em perceber aqueles que fazem questão de continuar na sua vidinha de sempre, reivindicando o direito a viver como querem e lhes apetece.
Ao fazê-lo, ao desprezar as normas de segurança sanitária, todos os dias atentam contra a liberdade dos outros, pois expõem-se e, pior, impõem-se a terceiros. Incluindo familiares, colegas e amigos. Mas esta é a parte da liberdade individual que não lhes interessa discutir: a que afeta os outros.